É injusto pedir-se que escreva a música que fazia nos Pavement, mas é com esta expectativa que muitos ouvem as canções de Stephen Malkmus desde o início da carreira a solo, em 2001.
É certo que o legado dos Pavement, uma das melhores bandas de sempre, não só é praticamente imaculado, como nem sequer se limita aos cinco álbuns de longa duração – já que os (muitos) b-sides da banda, entretanto lançados em reedições, seriam as melhores canções de muitas outras bandas. As críticas têm sempre esse ponto de comparação, quando um rumo totalmente pavementesco nem sequer teria grande lógica artística, porque os músicos têm direito a evoluir, como Malkmus não está nem aí.
Na maior parte do tempo, os discos desde o álbum homónimo – sempre acompanhado pelos Jicks, à excepção de um, não têm a acidez, angularidade, tensão, o cubismo e imprevisibilidade que Pavement nos apresentavam, muitas vezes em canções bastante curtas, aumentando o fascínio. Com os Jicks, SM quer rockar com espaço, o que por vezes lhe retira objectividade. Isto quer dizer que devemos olhar para eles por aquilo que são, e não com os óculos das saudades dos anos 90.
No que toca aos trabalhos desde 2001, Malkmus parece ter estabelecido os seus limites, por um lado, nas canções mais curtas, com o primeiro disco, e por outro, nas jams mais soltas, com Real Emotional Trash, de 2008. Entre estes, Pig Lib tinha algumas grandes canções, mas sofreu com uma produção desadequada; Face The Truth, de 2005, apenas era demasiado heterogéneo e pouco memorável à excepção de duas ou três canções.
Tendo em conta estes pontos de referência, Malkmus parece estar focado em conseguir álbuns que, ainda que francamente diversificados, mantenham uma maior homogeneidade. Wig Out é parecido com o disco precedente, Mirror Traffic, sendo até melhor no seu todo.
O disco começa com “Planetary Motion”, cheio de fuzz e com um espírito meio coxo de um compasso ímpar, mas não com menos groove por isso. “The Janitor Revealed” é talvez a pior faixa do álbum, não sendo má. “Lariat” foi o primeiro single do disco – uma canção leve e divertida, não sendo tão forte como “Senator”, de Mirror Traffic. “Houston Hades” resume o espírito do Malkmus dos últimos anos: é nela que consegue pavonear-se e soar a felicidade. “Shibboleth” soa mais a Pixies do que a Pavement e é esquisita quanto baste para dar mais variedade ao álbum. A primeira parte do disco fecha com uma espécie de balada meets Burt Bacharach, chamada “J Smoov” e que é o ponto alto do disco em termos de beleza, onde – pasme-se – se ouvem metais.
Num imaginário lado B, “Rumble at the Rainbo” e “Chartjunk” funcionam como uma espécie de “Senator” dividida em duas partes e mantêm Wig Out em padrões elevados. “Independence Street” parece uma balada do final dos anos 70 e dá algum prazer por, simultaneamente, não o ser. “Scattegories” é meia tonta e tem alguma da capacidade brincalhona dos Pavement. A penúltima faixa, “Cinnamon and Lesbians”, não é uma canção muito forte e foi uma escolha estranha para segundo single. Novamente, volta a fechar-se um lado com uma jam, “Surreal Teenagers”, canção que já existia há dois anos – é uma espécie de “Do Not Feed the Oyster”, de Pig Lib, mais rockeira.
Wig Out at Jagbags é um disco que se passeia com conforto e que soa à placidez que nunca ninguém quis que Stephen Malkmus tivesse, senão ele próprio. O que SM nos tem vindo a sugerir, é que não devemos ter barreiras no que toca ao nosso gosto, como a apreciação de música mais próxima do punk não ter de invalidar um gosto por rock clássico, psicadélico ou progressivo – apesar de Wig Out não pertencer, declaradamente, a nenhum destes estilos. Isto porque Malkmus nos continua a dar canções memoráveis e que só ele poderia escrever, nos álbuns a solo – mesmo quando estes não são perfeitos. Este álbum continua a não o ser e não é, certamente, música essencial para esta geração, mas não deixa de ser um privilégio ouvirmos um dos grandes a fazer canções. E, ao não parar, Malkmus já está a fazer um serviço ao resto do mundo.