O impossível aconteceu. O intransponível álbum de estreia de Bruno Pernadas (disco sensação de 2014) foi transposto na íntegra para o palco, sem espinhas nem grainhas. Com o perfeccionismo que Bruno nos habituou, ouvimos How Can We Be Joyful In a World Full of Knowledge na exacta ordem do disco, sem pausas entre as músicas nem fúteis conversas com o público, de tal forma que por um momento pensámos estar em casa, em pijama e roupão, a ouvir o CD no langor do sofá. Um apinhado Maria Matos em êxtase colectivo depressa nos chamou à razão.
O palco estava pejado de folhas de palmeira e plantas exóticas, recriando assim o ambiente tropical que atravessa todo o disco. A parte de leão que acompanhou Pernadas nesta viagem pela selva amazónica (muitos deles companheiros de estrada de Bruno na Pataca Discos) já participara no disco: João Correia (TAPE JUNk e Julie & the Carjackers) na bateria; Francisca “Minta” Cortesão e Afonso Cabral dos YCWCB na guitarra e voz; Margarida Campelo dos Julie & the Carjackers nas teclas e voz; João Capinha, Zé Maria e Moisés Fernandes nos sopros. Como não pode haver overdubs ao vivo, o baixo e a segunda guitarra tocadas pelo próprio Pernadas no disco tiveram que ser entregues a Nuno Lucas e a Ricardo Gouveia. Por fim, uma convidada especial: a voz etérea de Rita Martins. Estavam então duas tradições musicais muito diferentes em palco: a malta erudita do jazz, com a inevitável partitura à frente, e o pessoal da pop e do rock’n’roll, com a sua aversão natural a claves e colcheias pintalgadas no papel. Bruno Pernadas foi a ponte entre estes dois mundos, que se fizeram um só numa noite memorável.
O incansável Bruno corria apressado das guitarras para o sampler e dos teclados para o vibrafone, ao mesmo tempo que assegurava, meticuloso, toda a direcção musical. Em nada nos importámos que o tímido Bruno tivesse olimpicamente ignorado o seu público. Depressa aprendemos que até as nossas palmas eram indesejáveis porque interferiam com o rigor musical que Pernadas almejava. O resultado final recompensou tudo: a mais absoluta perfeição.
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(Fotografias gentilmente cedida por José Frade)