A apresentação de Buoys na Culturgest apanhou-nos de surpresa e aponta-nos para um possível futuro na música de Panda Bear
Que o techno sempre foi uma referência importante no universo musical de Noah Lennox, ninguém põe em causa. A componente rítmica é a principal responsável pelas viagens mais transcendentes dos Animal Collective. No entanto, quer em disco quer nos concertos ao vivo, a carreira a solo de Panda Bear dificilmente nos permite vislumbrar esta influência (o músico descreveu a sua música como dub em tempos recentes).
No início deste ano, mais ou menos vindo do nada, surge Buoys, um disco que pretende mudar a narrativa por completo. Influenciado pelo trap e o reggaeton, o disco vê todo o seu poder concentrado nas baixas frequências. As linhas de baixo viscosas e as batidas industriais dominam instrumentais salpicados por uma guitarra acústica e a voz macia de Lennox. No dia 24 de Abril, o público inocente no Grande Auditório da Culturgest foi vítima de um assalto sonoro pelas mãos do músico americano.
Começando com a elástica “Home Free”, Panda Bear enfeitiçou-nos com um sample de guitarra acústica e a sua voz serpenteante para depois nos apanhar de surpresa com uma versão dub minimalista de “Comfy in Nautica” do divisor-de-águas Person Pitch de 2007. A ausência de harmonias, que em tempos anteriores evidenciava algumas imperfeições na sua voz, deixou de ser um problema: a capacidade vocal de Lennox está melhor que nunca e o minimalismo dos seus últimos trabalhos permite que o músico leve as suas cordas vocais ao limite.
Depois do embale destas duas canções, surge a primeira explosão: “Nod to the Folks”, um dos pontos fracos do excelente A Day with the Homies, lançado no princípio de 2018, ganha uma nova vida ao vivo, o seu jogo de contrastes acentuado pelo beat distorcido que acompanha a música. Entre versos, somos brindados com uma rave na qual o beat acelera até se tornar num drone fracturante enquanto as luzes estroboscópicas nos encaminham para uma dimensão paralela.
Depois do par “Part of the Math” e “Shepard Tone” na qual Panda Bear demonstrou amplamente os seus poderes vocais, começa a sério a apresentação de Buoys. A guitarra lo-fi de “Token” saltitava à volta da sala em glorioso stereo, conferindo-lhe mais espaço para respirar do que o relativo sufoco da versão de estúdio, o drop manso de “Buoys” transforma-se num tornado de ruído branco e “Dolphin” fragmenta-se em abstrações psicadélicas.
Como não podia deixar de ser, houve tempo para estrear uma composição nova: “Playing the Long Game” é talvez a canção mais minimalista que Lennox alguma vez compôs: Uma linha de sintetizador vinda diretamente de uma memória mal lembrada dos anos oitenta e um beat poeirento formam a cama de uma música que parece indicar a nova direção musical de Panda Bear. O adeus foi dado com “Last Night at the Jetty” do malfadado Tomboy e a despedida não podia ser melhor. Num dos versos, o músico questiona “Didn’t we have a good time?”. A resposta é um sim lacrimejante.