Não sabendo nada do que me esperava, resolvi ver Cadillac Records como um daqueles filmes de domingo à tarde. Qualquer coisa leve que distraísse, que falasse sobre música. Mas cedo percebi que, mais do que um filme, Cadillac Records retrata em forma de biopic, (ou como quem diz, documentário em forma de filme) uma época importantíssima na música contemporânea.
A época é esta: dos inícios dos anos 40 até ao fim dos 60, na América das convulsões raciais, da altura em que, por força do deslocamento dos brancos para a guerra, os afro-americanos viram-se na oportunidade de deixar os campos de escravos e tentar fazer vida nas grandes cidades. E se cada português tem fado nas veias, também os afro-americanos têm blues na alma. E nessa conjugação de factores surge Muddy Waters, um dos primeiros ícones da história do rhythm & blues, aqui representado por Jeffrey Wright. Muddy foi descoberto por Leonard Chess (Adrien Brody), um tipo que não ligando às patéticas lutas raciais e que tinha como simples sonho poder dar uma boa vida à sua mulher, percebeu que o mercado da chamada race music era um filão por explorar. Fundou uma das mais importantes editoras da época, a Chess Records e proporcionou a Muddy Waters a gravação de vários álbuns que desde logo chegaram aos primeiros lugares dos tops. Muddy foi o primeiro negro a ter um contrato assinado com uma editora. Abriu ainda portas a Little Walter, Howlin’ Wolf, Etta James e ao pai negro do Rock N’ Roll, Chuck Berry, que influenciou nada mais nada menos do que, por exemplo, os Rolling Stones, os Beatles, os Animals, etc, etc…
Em Cadillac Records vemos os altos e baixos da vida do Blues e percebemos a enorme importância da música no derrubar das barreiras raciais. Os jovens americanos, fartos de guerras, e querendo apenas ouvir boa música, começaram a elevar estes artistas ao estrelato. Este Rock e este Blues eram bons demais para ignorar só porque quem o cantava não era da mesma cor.