Mais de 30 anos de carreira e os Mayhem continuam a mostrar que estão cá para ficar, deixando no Lisboa ao Vivo um concerto inesquecível.
Tinha chegado finalmente uma das noites mais antecipadas do ano. Seriam os Mayhem capazes de defender a sua reputação como lendas vivas do black metal e darem um concerto tão bom como no SWR? Mostrar-se iam dignos de tamanha honra as bandas de suporte? Não quero que se pense que o mundo da música é uma competição, mas a verdade é que as expectativas para este evento eram bastante altas.
Infelizmente não foi possível assistir a quase todo o concerto dos The Ominous Circle devido à manifestação da PSP, que empatou os transportes dentro da cidade (para mais informações sobre o assunto ouçam um certo EP que os Doom lançaram em ’89).
Seguiram-se os Dragged into Sunlight dos quais se esperava um concerto ritualístico com uma atmosfera negra e pesada, e foi isso que aconteceu… mas com um pequeno senão. Digam o que quiserem sobre a música dos Dragged into Sunlight ser niilista e misantrópica (tal como foi dito), mas quando quatro músicos se viram de costas para o público durante a totalidade do concerto qualquer tipo de declaração anti-humanista que daí pode vir é simplesmente diluída pelo aborrecimento. Sonicamente o concerto foi irrepreensível, mas se a música fosse a única coisa que importasse ficava-se em casa a ouvir os álbuns. A verdade é que um concerto tem de ser mais do que apenas música – deve ser um espetáculo, e, a meu ver, houve bastantes falhas nesse sentido.
Quando surge o riff inicial de “Funeral Fog” foi como se toda a sala tivesse sido transportada para outro mundo – um mundo gélido, morto, transcendental – o mundo de De Mysteriis Dom Sathanas. E a única entidade capaz de nos guiar é Atilla Csihar ao qual, infelizmente, foi dado um microfone defeituoso, deixando em silêncio os primeiros salmos desta missa negra. Seguiu-se “Freezing Moon”. Nada que seja dito é capaz de fazer justiça ao que é a experiência de ver e ouvir ao vivo um dos temas mais emblemáticos do black metal norueguês.
É difícil dar seguimento a um concerto quando se acaba de tocar a música que o público mais esperava ouvir, mas os Mayhem são uma banda que transcende o status quo daquilo que é esperado de um concerto e, através da energia e riffs frenéticos de “Cursed in Eternity” e “Pagan Fears”, nenhum ímpeto foi perdido. “Life Eternal” foi um dos pontos altos, quer pela performance sobrenatural de Atilla, capaz de encarnar as letras como se ele próprio as estivesse escrito, como pela icónica linha de baixo. É o tema que mais espíritos traz do passado negro da banda.
Nada põe tão facilmente um sorriso na cara como o segundo riff de “From The Dark Past”, por isso havia receio que não se traduzisse bem ao vivo, mas felizmente não havia motivos de preocupação. Há poucos slides de guitarra tão desconcertantes e ao mesmo tempo tão deliciosos como aquele. A reta final do concerto foi composta por dois dos temas mais assombrosos do álbum – “Buried By Time and Dust” e “De Mysteriis Dom Sathanas” – que serviram como o epitáfio perfeito para uma noite que não será facilmente esquecida pelos presentes.
O passado está bem vivo, e os Mayhem também.