
Os Kikagaku Moyo não são novidade nenhuma para o público português. Compositores de alguma da melhor música que se tem feito na nova vaga psicadélica dos últimos anos, os cinco rapazes de Tokyo regressaram no domingo passado à Galeria Zé dos Bois, por onde tinham passado há exactamente um ano – desta vez para apresentar o disco House In The Tall Grass, lançado em Maio passado.
A noite adivinhava-se mágica e quem a iniciou foram os Asimov. Primitivos nas vestes, cabelos, barbas e riffs, aqueceram os corpos presentes com o seu psicadelismo pesado e impiedoso. Apresentando os temas do seu recém-lançado disco Truth, o duo do Cacém arranhou sem medo as peles e a garganta da plateia que ia chegando. Esgotada a lotação, a primeira parte terminava e toda a atenção se virava para as imponentes figuras que entravam em palco, afinando instrumentos, preparando o palco para o ritual que daí a pouco começaria.
Tímidos, de sorriso escondido por entre os longos e escuros cabelos, os Kikagaku Moyo (em português, Padrões Geométricos) pegaram nos seus instrumentos e começaram os primeiros ritos. Arpejos de guitarra e escalas de sitar introduziam-nos num transe calmo e meditativo, numa sonoridade que remontava à luz de Ananda Shankar. De seguida, o ambiente começava a aquecer com jams psicadélicas à anos 60/70 que faziam delirar qualquer um. O sitar a tomar as rédeas prendeu-nos definitivamente o ouvido, dando lugar a um rock criador de mundos, que nos ouvidos entrava e pelo terceiro olho saía. Ritmos ora brandos ora acelerados, divertidos e eternos, hinos plácidos que passavam a hinos stoner, banhados pelo instrumento indiano mais conhecido do psicadelismo.
O sonho hippie tornava-se realidade quando apenas se ouvia o dito instrumento, apoiado num baixo confortável, e uma mandala ia nascendo e crescendo, se espalhando pelas paredes do aquário, chão tecto e pessoas feitos parte do enorme padrão da geometria universal, todas as partes em comunhão no Todo.
Uma vez atingida a paz, a igualdade e o amor, os jovens nipónicos deixariam o palco antes de um encore que todos precisávamos, depois de nos apercebermos do que tínhamos presenciado. Ouvimos “Kodama”, do disco Forest of Lost Children, de 2013 e agradecemos-lhes a visita, sabendo que vir para os antípodas não é pêra doce. Sentimos-lhes a felicidade nas feições, nos olhos rasgados e nas bochechas cheias de luz. E pedimos-lhes que voltem, bem depressa se possível.
Fotografias gentilmente cedidas por Vera Marmelo