Seguramente que a maioria dos que lêem o Altamont já se depararam com o nome Jim O’Rourke, assim como eu. É provável que – entre leitores e outros escribas Altamont – muitos o conheçam já, que é coisa que até há pouco tempo não podia dizer. Continuo sem o conhecer de forma completa, é certo, mas estou já minimamente a par de algumas das coisas em que O’Rourke esteve metido, desde a participação nos Sonic Youth em discos como o Murray Street, ao trabalho de mistura do fabuloso Yankee Hotel Foxtrot dos Wilco, passando pelo seu envolvimento nos Loose Fur (banda que criou juntamente com Jeff Tweedy e Glenn Kotche, que originou dois discos – o primeiro, único que ouvi, recomenda-se) e pelos seus extensos trabalhos a solo, dos quais só posso falar dos que serão porventura os mais conhecidos: Insignificance, de 2001, o bonito e inteiramente instrumental The Visitor, de 2009, e o actual Simple Songs, de 2015. Agora que já assumi o atraso temporal da minha atenção à carreira deste americano, nascido em Chicago, falemos directamente de Simple Songs: ouvi-o pela primeira vez em pré-estreia no site da NPR, no passado mês de Maio, e só pensava de onde é que o tipo saiu (resposta: de todo o lado).
O título é desde logo curioso. O que aqui temos não são exactamente canções simples – os arranjos são até complexos, e porventura de recepção pouco imediata -, mas ao mesmo tempo não são também temas experimentais no sentido mais utilizado do termo: Jim O’Rourke compôs aqui canções, de formato relativamente estável e definido, mas dentro dessa estrutura criou canções interessantes, que soam por um lado “simples”, mas por outro profundamente diferentes das da maioria dos seus contemporâneos – sobretudo dos que se movem nos territórios rock.
Este era um disco que cabia bem ali na colecção dos anos 70: ambicioso, grandioso, mas com sensibilidade rock, a saber jogar no limite do foleiro mas encontrando-se do lado de cá pelo bom gosto, pelo pouco histrionismo e pela recusa na procura de soluções simples para as canções: versos e linhas instrumentais construídas com truques exaustos de tão utilizados nos tempos mais recentes. Na realidade O’Rourke faz um disco de uma delicadeza (ou sensibilidade) melódica, por vezes quase épica, que tem esse espírito rock sem necessariamente ser puramente rock – nos instrumentos utilizados, no formato da canção e na acalmia que por vezes paira no disco (essencial o uso do piano). Uma acalmia que por vezes é épica, o que faz com que – felizmente – não seja nem rock de estádio à Foo Fighters nem uma espécie de orquestra sinfónica a tocar temas rock.
Há temas que, não sendo maus, têm uma qualidade mais baixa, mas a maioria estará seguramente entre aquilo que de melhor se fez (e que provavelmente se fará) este ano: “Friends with benefits” é uma excelente abertura, “Half Life Crisis” é uma canção pop nada foleira (só o parecerá a uma audição apressada) e “Hotel Blue” é belíssima, de um classicismo difícil de superar.
Quatro anos depois de The Visitor, Jim O’Rourke traz-nos agora “canções simples”. Aquilo que se seguirá é um ponto de interrogação dos grandes, e a dificuldade de o catalogar e de o encaixar na indústria é também o que o torna um dos actores mais singulares da música americana destas primeiras duas décadas.