Um ano de correspondência entre dois amigos, com canções a fazerem de cartas, resulta num disco íntimo e muito bonito
Jens e Annika são ambos suecos e ambos têm uma carreira musical já com alguns anos, embora ele tenha chegado mais a públicos internacionais do que ela. Já se conheciam mas sem grande intimidade, mas Jens sentia que ela era alguém que o entenderia e que, na verdade, poderiam ser grandes amigos se ao menos vivessem na mesma cidade.
No meio de vários problemas pessoais, Lekman teve uma boa ideia: corresponderem-se durante um ano mas, em vez de cartas, mandariam canções um ao outro. Annika aceitou com entusiasmo, e as regras ficaram definidas. Cada um enviaria uma canção de dois em dois meses e só poderiam usar voz e um outro instrumento, fosse ele qual fosse.
Assim, durante o ano de 2018, foram cumprindo o acordo e colocando as canções online. Agora, em 2019, decidiram-se a editar essas 12 músicas, já com uma mistura de mais qualidade e juntando subtis cordas aqui e ali. O resultado é este apropriadamente intitulado Correspondence, a correspondência musical/espistolar destes dois amigos, durante um ano que viu atentados, a ascensão de populistas e a urgência climática a subir de tom.
O temas são variados, começando em Janeiro com “Who Really Needs Who”, em que Jens estende a mão a Annika para o começo da correspondência. Temos desde episódios quase corriqueiros do dia a dia até reminiscências do passado e da juventude de cada um, num diálogo nem sempre linear mas sempre significativo. Os músicos criaram um site para esta empreitada onde se podem ler as letras e até as histórias por detrás de cada canção (é enternecedor ver que, quando a canção anterior do comparsa sugere dor ou depressão, a tentação do autor daquele mês é de oferecer consolo e esperança através da música).
O conceito é inegavelmente interessante, mas não nos esqueçamos do essencial: as músicas. Correspondence não é apenas uma boa ideia, resulta num disco muito bonito e perpassado por uma ternura quase nerd, à qual é difícil resistir. Músicas simples mas de uma beleza desarmante, letras pessoais e bem escritas, uma amizade transformada em som.
E é desta bela mansidão que se faz um dos discos mais encantadores dos últimos largos meses.