Canção do dia

“Grândola, Vila Morena” – José Afonso

O hino maior da vida de Zeca Afonso e talvez da música portuguesa, “Grândola, Vila Morena” nasceu nos anos 60, após uma visita do músico à Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense. A emoção sentida nesse contacto – e Zeca tinha um modesto refúgio ali perto, na aldeia de São Francisco da Serra – levou-o a compor esta ode à fraternidade entre os homens, canto de luta e de solidariedade impregnado do arrepiante, nobre e popular cante alentejano. Figurando no incontornável Cantigas do Maio, de 1971, este tema tem tanto de poder simbólico como de força musical, apesar da sua simplicidade. Nada está a mais, nada falta, nem sequer o som de homens a caminhar lado a lado, captado pelos passos de Zeca, Francisco Fanhais, Bóris e José Mário Branco, numa madrugada às portas do estúdio francês onde o disco foi gravado. “Grândola, Vila Morena” ficou para sempre marcada pelo papel simbólico desempenhado na noite de 24 de Abril de 1974 quando, nas ondas da insuspeita Rádio Renascença, o jovem locutor Paulo Coelho recitou a primeira estrofe da canção, colocando-a de seguida a tocar. Era o sinal de que a Revolução já não podia parar. Curiosamente, essa não foi a primeira escolha dos militares para esse momento. Otelo Saraiva de Carvalho queria “Traz Outro Amigo Também” mas acabou por ser escolhida “Venham Mais Cinco”. Problema: esta última estava banida de passar na Renascença, enquanto “Grândola Vila Morena” poderia passar sem levantar suspeitas. Ficou aí marcada a história de uma canção que tem muitas vidas, sendo cantada em França ou em Espanha, e presença ainda hoje em protestos de raiz popular. O povo português, em forma de canção.

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