
O disco que, após nove meses de gestação, nasceu agora para o mundo, pode ser mini, mas o concerto que Pedro Chau e Pedro Oliveira, mais conhecidos coletivamente como Ghost Hunt, deram na passada sexta-feira, dia 11 de novembro, no Salão Brasil, foi do tamanho que eles quisessem. Porque a música dos Ghost Hunt é uma música de plasticina, música moldável às vontades e caprichos de quem os vê, música que se entranha nas peles e obriga à dança, música que dá vontade de muito mais do que um modesto concerto na modesta cidade que os viu nascer.
O que prometia ser uma viagem pelo mundo da sintetização pela noite fora começou com os também conimbricenses Wipeout Beat. Miguel Padilha, Pedro Antunes e Carlos Dias foram os encarregues de abrir as celebrações. Aos já esperados sintetizadores (três monstros de som em palco, por vezes), juntavam-se ocasionalmente a guitarra a transbordar distorção e as vocais, estas partilhadas entre os três membros da coletiva, que vociferavam cada um com uma entrega mais vibrante do que o outro. A noite sabia a festa, graças às melodias dançáveis e bem-dispostas, além do bom ambiente constante em cima do palco, a puxar mais à década de oitenta do que à de dois mil e dez, mas sem que a música nunca caísse naquele enjoo de tributo que só dá para comer a nostalgia barata – tudo soava a felicidade, seja onde fosse e em qualquer época.
Depois da insustentável leveza da abertura, o peso derradeiro do ato principal. Ghost Hunt entraram em palco silenciosos e debruçaram-se cada um sobre o seu instrumento de escolha: para Pedro Chau e Pedro Oliveira, três já é uma multidão, e percebe-se porquê. Cada membro domina o seu hemisfério de excelência – Pedro Oliveira imerso num mar de sintetizadores e Pedro Chau de baixo em riste -, e chegou para encher a casa. Quem escolhera aquela noite fria de São Martinho para ocupar o Salão Brasil calou-se com a chegada da banda ao palco, imersos pela eletrónica certinha e bem-oleada, que nos faz viajar para uma cave sombria algures em Berlim, de olhos fechados e punhos cerrados. A sala transformou-se, envolta em silêncio e escuridão, salvo as projeções que inundavam também os músicos nos seus tons cinzentos e mostravam ondas que serpenteavam ao sabor das melodias secas e precisas. Um outro mundo.
Houve espaço para tudo – desde uma cover de Daniel Miller, “T.V.O.D.”, com Pedro Chau encarregue das vocais robóticas – a uma exibição exuberante do novo single da banda – a energética “Games”. É música circular, labiríntica, mas que não cansa, pelo contrário, que se vai multiplicando em significados e camadas várias, prendendo os pés do ouvinte à pista de dança. Com a uma da manhã à porta, o entusiasmo da plateia e os vários pedidos da plateia deram azo à transformação daquela velha prece “só mais uma” numa realidade, com uma versão ligeiramente alterada de “Disconnection.”
Foi uma noite bem passada, um momento de quentura numa salinha escondida de uma cidade congelada pela neblina, que nos permitiu viajar para outras épocas e locais, embebedando-nos ao sabor dos sintetizadores constantes e de um baixo que os domina, os amestra, lhes dá o norte, abanando a cabeça aos batuques que não cessam. Para mais concertos destes em sítios cada vez maiores e maiores, para que mais gente possa ficar bêbada sem beber uma única gota de álcool. Wipeout Beat, obrigada. Ghost Hunt, obrigada.
Fotos: Luís Marujo