A nossa primeira reacção é “o que raio é isto?”, de tal forma a sua linguagem é ousada e original.
Destratámos muitas vezes nestas linhas o século XXI: que era preguiçoso, que se encostava à reciclagem do passado, que desistira do desconhecido. Mentimos. A inovação existe e o grime faz disso prova.
Os cínicos torcerão o nariz, acusando o género de mais não ser do que hip-hop com sotaque cockney, rap com bacon and eggs. Não têm razão. É uma tradição diferente, mais herdeira da electrónica londrina do que dos MCs do Bronx, uma espécie de filho mal-criado do UK Garage. Enquanto a mãe é frívola e escapista, a sua prole é rude e verdadeira, trocando os falsos brilhos das garrafas de champanhe pelo betão acre da vida no gueto. Preferimos o filho da mãe. Sempre.
E é aqui que chamamos Dizzee Rascal, que com o rasgo do seu disco de estreia se tornou o grande embaixador do grime. A nossa primeira reacção é “o que raio é isto?”, de tal forma a sua linguagem é ousada e original. A base do garage está lá – os ritmos fragmentados, os sub-baixos gordos, os pratos de choque irrequietos – mas tudo é agora tão nervoso, dissonante e desconjuntado que nos soa totalmente a novo. A voz de Dizzee vai no mesmo caminho, um rap aflito e assustado, sempre à beira do ataque de ansiedade.
Nada disto é por acaso. Esta estética do feio cumpre uma função: traduzir em sons a atmosfera lixada do bairro social de Londres Este onde Dizzee cresceu. Ao contrário do que sucede com o boçal gangsta rap americano, não há aqui qualquer glamorização, bem pelo contrário. No mundo de Dizzee, as margens são lugares mal situados, ponto. A violência, o perigo, o abandono, o sexo como moeda de troca, a perda precoce da inocência, não têm para Dizzee qualquer poesia.
Qual é então o veredicto? Bem, os polaróides são exactos e os gritos por ajuda mais do que justos, mas isso é pouco mais do que irrelevante. É a sua beleza que o transforma em obra de arte. A estranha beleza que pode haver quando já não há qualquer esperança.