Frog In Boiling Water é um disco que deve ser tomado em doses moderadas, para não mergulharmos em negação filantrópica.
Bastava o título do álbum, e a respectiva metáfora contida nele, para despertar a curiosidade para uma audição prospectiva de Frog In Boiling Water. Ao quarto longa duração, os DIIV acordam de um tingido Deceiver, para uma amarga tomada de consciência. Um disco conceptual que resulta de dissabores e conturbações, maximizadas pelo negro período da pandemia, e pela apreensão de Zachary Cole Smith por posse de drogas pesadas.
Para quem não se recorda da experiência e é menos entusiasta de biologia, se colocarmos uma rã numa panela de água ao lume, ela vai progressivamente adaptando-se ao aumento da temperatura. Até deixar de ser capaz de acompanhar tamanha exigência. Quando a água entra em ebulição, a rã, exaurida de mais recursos, sem capacidade de reacção, acaba por sucumbir à fervura. Tal como o nosso lento e doentio colapso face ao sistema e à brutal realidade que cada vez mais aceitamos como norma. É disto que se trata o quarto disco da banda de Brooklyn. Uma angústia existencialista de dentro para fora.
Os DIIV, inicialmente Dive (inspirados pela música de Nirvana com o mesmo nome), optaram por mudar para DIIV, depois de terem constatado que já existia uma banda belga de EBM com o mesmo nome, muito embora estejamos a falar de audiências bastante assimétricas. A banda norte americana, amplamente venerada por um público de jovens rebeldes eruditos com tendências urbano-depressivas, e de fácil apetência para o uso de drogas, já é reconhecida na história do rock alternativo moderno, como uma banda que irá influenciar de forma perene a geração 10/20. A sua sonoridade seminal, após a disseminação massiva do universal “Doused”, relançou o universo shoegaze para a frente das prateleiras das lojas de discos. Brooklyn estava de volta, carregada de carácter revolucionário e sangue novo. Estávamos em 2012, ano em que David Guetta, Lana Del Rey e Drake dominavam os tops internacionais, ao mesmo tempo que a comitiva de Cole Smith invadia os corações da ala mais atenta da dita música alternativa.
Mas será Frog In Boiling Water um disco de shoegaze? A resposta é afirmativa. E será um disco típico de DIIV? A resposta também é sim, embora este quarto longa duração seja mais do que apenas isso. É um disco atmosférico que entra na intimidade de Zachary, ao mesmo tempo que se apresenta como manifesto de intervenção política sobre uma actualidade quase quase irreversível “I can’t look away, In anger, I want to disappear, In amber”. Assim começa o álbum vermelho da banda de Brooklyn, consternados e feridos pelo sistema que os assedia. Um lamento fourierista, gritado em voz baixa, por uma sociedade libertária e equânime. Dores de quem acredita que as coisas ainda podem mudar (para melhor).
Neste quarto álbum conseguimos perceber melhor a verdadeira importância de um produtor. A decisão de colocar mais palco, aumentar a proximidade das guitarras ou reduzi-las a papel de parede, permitindo que ligeiros ruídos quase indefinidos sobrevivam à esmagadora armada Fender, demonstra que a escolha de Chris Coady é tão certa quanto inevitável. Habituado a trabalhar bandas como Beach House, Slowdive ou Roosevelt, o método onírico e atmosférico do produtor de Baltimore veio enfatizar justamente o conceptualismo que este último trabalho da banda nova-iorquina compreende.
Sugiro então três músicas como aperitivo para uma primeira infiltração no apoquentado mundo de Frog In Boiling Water: a fotogénica “Brown Paper Bag”, a sentida “Everyone Out” e a poderosa “Soul-net”. Depois de digeridos estes três singles, é altura de apreciar a restante obra no seu todo. Um elogio memorável à sublimação da distorção dos sentimentos, convertidos em música moderna. Um merecido quase oito para um disco que volta a posicionar os DIIV na categoria dos melhores do ano.