O segundo álbum de Cut Worms, Nobody Lives Here Anymore, é um maravilhoso casulo nostálgico que não queremos deixar de ouvir.
Nobody lives here anymore é um sopro quente que Max Clarke, músico e ilustrador norte-americano de Brooklyn que aqui assina como Cut Worms, nos traz em 17 faixas sonoras que não se esgotam numa primeira escuta.
Referenciado já aqui como um dos 60 álbuns que lhe podem ter escapado em 2020, este é o segundo álbum de Clarke, aqui apresentado em versão dupla, que equilibra o classicismo da música country dos anos 50 com uma suave tonalidade pop dos anos, que tanto nos faz revisitar The Everly Brothers como o folk rock de George Harrison. Talvez esta sonoridade familiar seja uma das primeiras faces a nos cativar de imediato, com a voz doce e melódica a prender-nos de imediato a atenção. A simplicidade das guitarras e as vozes de fundo, numa segunda camada, vão construindo um ambiente de conforto ainda maior, tecendo um casulo nostálgico a que nos recusamos a deixar prontamente.
Mas Clarke não se deixa ficar pelas reminiscências sonoras. Há algo de refrescante e contemporâneo nas suas composições, muito em parte devido às suas letras. Se por um lado encontramos belíssimas e delicadas músicas sobre amor e romance (Walk with Me espelha a graciosidade de um passeio, da mão segurando a nossa, em All the Roads, Clarke diz “all the roads still lead back to you.”), outras espelham um pouco da sociedade dos nossos dias, numa reflexão contemplativa sobre um certo vazio (e que, à luz dos tempos mais recentes, parece nunca ter estado tão presente na geração mais jovem como agora), procurando recuperar a infância construída enquanto porto seguro de sonhos que nunca se chegam a materializar. No seu comunicado sobre o lançamento do álbum, menciona que é sobretudo sobre a “cultura de consumo descartável e como esses desejos produzidos no pós-guerra nunca se tornaram realidade, como nada é feito para durar”. E é para estas impressões que os seus versos nos puxam também, para a realidade do desmoronamento dos nossos sonhos, como chega a cantar em Castle in the Clouds, “Close your eyes and you’ll fall right through the floor / There are things in this world that are real / All your life but you’re taught to ignore”.
O álbum termina com uma das músicas mais bonitas, Cave of Phantoms, de remate esperançoso, como que a encaminhar-nos em direcção a um pôr-de-sol. Hold on tight, I’ll meet you in the mornin’.
A ligeireza com que dedilha e canta sem abalar a confiança com que dita as suas palavras, executando com rigor e minúcia e sem nunca cair em excesso de tempo e de tom, leva a que nos deixe facilmente a cantar em uníssono e que, mesmo em silêncio, as suas melodias se prolonguem e nos continuem a acompanhar.
Precisamos de mais passeios em paisagens doces como Nobody lives here anymore. Este é um convite para uma viagem no tempo sem nunca perder de vista o presente.