A identidade de uma autêntica estrela de rock é algo de bizarro, indefinido. Não sabemos se propositamente, ou se apenas por o caracter de intrépida criatividade dessas pessoas, não nos dar as pistas suficientes do que se poderá passar dentro das suas mentes.
Onde anda Camille? Estas e outras questões, são iscos que nos atraem para lá da obra física das ditas estrelas (que nos iluminam a vida dias sem fio). São quizzes conceptuais que intrigam o público mais atento, e oferecem-lhes uma dimensão que os aproxima do plano fantástico – um dos melhores exemplos dessa estratégia é o projecto virtual Gorillaz de Damon Albarn.
Depois de ter visto o concerto que Connan deu em Barcelos no Milhões de Festa, em Agosto de 2011, a minha impressão acerca do seu trabalho saiu ainda mais reforçada. Figura enigmática, com uma dimensão energética completamente fora do comum, Connan Tant Hosford brindou aquele restrito grupo de afortunados com um concerto absolutamente mágico. A aceitação foi muito superior à do que se esperava, apesar de grande parte da plateia já conhecer, e bem, o álbum de estreia do neozelandês. Aliás, quando Connan tocou o tema que dá nome ao álbum, Forever Dolphin Love, o público estava de tal forma hipnotizado com a sua performance que, a mando do Guru, sentou-se, em uníssono e sem reservas, no chão do anfiteatro de Barcelos, para adorar aquela fabulosa história de amor entre um homem e uma golfinho. No fim do espectáculo, incrédulos, todos pensamos o mesmo: este homem tem que continuar a dar concertos!
E as preces foram ouvidas. E aceites pelo concílio das belas artes. Hoje, dia 4 de Novembro, sai o segundo disco de originais de Connan Mockasin, que curiosamente começa com a despedida do tal amor insuportável entre homem e golfinho. E é mesmo um caramelo, esta segunda aparição do Super Herói da Stratocaster arraçada de Vox Teardrop.
Gravado num quarto de hotel em Tóquio, com poucos recursos e um imaginário profícuo, Connan exacerba o psycho-funk assente num modelo muito próprio de conceito de arte musical. Não há substantivo mais adequado para este trabalho do neozelandês. É artístico. Tem que ser artístico. Como o foram Histoire de Melody Nelson de Gainsbourg ou LC de Durutti Column. Apesar das reveladas simples motivações que o levaram a gravar o segundo álbum, o rapaz que fazia mocassins de pneus de bicicleta e pele de ovelha, levou um mês inteirinho a descobrir a melhor forma de imprimir em música, a languidez da sedução física e da incessante procura do amor carnal. E o Japão também entra na história. As vozes que se ouvem de imaginárias geishas modernas, arrastam-nos para um ambiente erótico. Mas um erotismo despojado de malícia. Um erotismo tipicamente japonês, onde a sensibilidade artística vence os preconceitos religiosos.
Caramel é uma verdadeira paródia das músicas sexys, que ultimamente tanto vendem na (M)TV como nas pistas de dança das periferias. Mas é muito mais que uma desajeitada paródia. É sim uma suave viagem let’s get physical através dos Bette Davis eyes. Pop? Sim, mas uma pop tão inteligente que mais parece restauro.
O meu único receio reside na monstruosa dúvida em saber se ele ao vivo, vai conseguir reproduzir algumas faixas deste disco. A combinação entre alucinação e realidade tem que ser exacta. Senão corremos o risco de o perder entre tergiversações egóicas indecifráveis. Por enquanto resta-me rezar, para que esta santa hipótese aconteça o mais urgentemente possível. Já agora em Portugal.