Como se capta a atenção? Sejam de ouvir, ler ou visitar, de comer ou de vestir, as recomendações chegam por todo o lado. Pelos amigos e família, pelas redes sociais, pelos tradicionais anúncios e media, ou pelo algoritmo que
não percebemos mas que, feliz ou infelizmente, raramente dispara para muito longe do alvo e hoje é fácil deixar escapar o bom, ainda mais fácil é perder demasiado tempo com o mau. E então, como se capta a atenção?
Não lhe conhecia a existência, não sei sequer como me chegou o disco, sei que carreguei no play e que fiquei até final de Flower of the Soul. Numa altura em que lutamos para não nos dispersarmos, em que o esforço tem de ser para o colocar o foco no essencial e não no acessório, Liana Flores consegue prender-nos a atenção. E como?
Inglesa de sangue brasileiro, criada em South Norfolfk mas a viver há dois anos em Londres, Liana Flores está em estreia, nos discos de pleno direito e no estatuto de artista de editora, no caso, a Verve Records. E a evolução é notória. Recently, o EP de 2019, foi gravado sem ajuda, no quarto em casa, apenas com recurso ao GarageBand, o mais básico dos programas de edição de som. Agora, teve direito a estúdio e banda de acompanhamento, a Noah Georgeson como produtor e à companhia de Chris Bear (baterista dos Grizzly Bear), de Jacques Morelenbaum (contrabaixo) e de Tim Bernardes, com quem partilha “Butterflies”, um dos pontos altos do disco. O suficiente para lhe chamar a atenção?
Liana Flores não é fácil de catalogar. A música soa a folk, mas sempre com um forte travo a Bossa Nova e quase sempre acompanhada, ao fundo, com um toque de Jazz. Uma receita que pode ser tudo ou nada, que pode levar
a resultados épicos ou música sem sabor ou identidade, daquela que no limite nunca passará de um disco simpático, daqueles que ouvimos um par de vezes antes de o esquecermos por completo, já a caminho da novidade que se lhe seguiu.
Em “Orange-coloured day” ouvimos a melhor mistura entre o Jazz e a Bossa Nova, em “Now and Then”, o domínio perfeito dos cânones da Bossa Nova e depois ainda há “Butterflies”. Mas é “Nigthvisions”, com arranjos cuidados, uma mistura precisa entre a Folk e Bossa e uma subtil linha de guitarra, tão discreta como certeira, que a atenção dedicada sobe, naturalmente, de nível. É cedo para decretar a imortalidade da música de Flores e é real o risco de acabar reduzida a discretas presenças em playlists de música ambiente. Provável? Nem por isso. Ao longo de Flower of the Soul ouvimos Gilberto e Jobim, ouvimos até Beth Gibbons, numa versão mais delicada e inocente.
Há estreias que nos arrebatam, que nos enchem de certezas. Outras há que nos deixam curiosos, por ouvir o passo seguinte, por ver o aprimorar da fórmula e o definir da identidade, que nos deixam com vontade de ouvir mais. Liane Flores apanhou a nossa atenção, mas mais que isso deixou-nos com vontade de ouvir mais.