
Na passada quarta-feira, os Linda Martini convidaram-nos a ouvir, em primeira mão, meia dúzia de canções do novo disco – Sirumba -, que se preparam para apresentar amanhã, no Coliseu dos Recreios. No final, tivemos oportunidade para lhes perguntar por uma ou outra curiosidade que tínhamos sobre o seu quarto longa-duração. Por entre unicórnios, jogos da preparatória e conversas de adultos, a banda mostrou-nos as linhas principais da Sirumba, deixando-nos com apetite para a desenhar com giz no concerto de apresentação.
Altamont: Porque é que o disco se chama Sirumba?
André Henriques: É o nome de um jogo que nós jogávamos quando éramos miúdos, que era muito popular na altura e hoje parece que não é assim tanto. É basicamente um jogo da apanhada mais sofisticado, com outras regras. A capa do disco acaba por ilustrar o traçado que se fazia no chão a giz para jogar esse jogo. Surgiu primeiro como nome de uma música – a que abre o disco – porque todos nós andámos na mesma escola na preparatória e havia lá uma Sirumba. Era muito popular na altura e todos jogávamos. Foi um bocado por causa disso, é um conceito que nos une de alguma forma e gostamos de ir buscar essas coisas, como já tinha acontecido no Casa Ocupada.
E o que é o “Unicórnio de Sta. Engrácia”?
Pedro Geraldes: É uma música.
Cláudia Guerreiro: É a música em si, foi uma música difícil de fazer, demorou a ser caçada e teve umas obras muito longas até se concluir e acho que é por isso que se chama assim.
Com a sala de ensaios própria que agora têm, as dinâmicas de ensaio e gravação alteraram-se?
Pedro: Sim. Neste disco reflecte-se muito isso porque nós, além da sala de ensaios, passámos a ter mais disponibilidade. Então, pudemos ter mais tempo de composição. Como ensaiávamos ao final do dia, passámos a ter outro tipo de horários. E por isso, o disco foi mais pensado, num sentido positivo. O facto de termos tido mais tempo não quer dizer que estivéssemos sempre a tocar, nem sempre a tentar descobrir a pólvora. Mas esse tempo permitiu que o disco tivesse a produção que tem, mais cuidada. Nos próprios arranjos isso também foi pensado.
Cláudia: Ter uma sala e mais disponibilidade implica ter mais tempo para fazer o disco e explorar outras coisas, portanto tivemos mais espaço para descobrir coisas novas.
Este disco é menos imediato e tem menos distorção. Teve também a ver com essa maneira mais serena de fazer as coisas?
Pedro: Sim. Nós nunca ficámos muito satisfeitos com a produção dos discos anteriores. Às vezes é difícil justificar ou apontar realmente o que é que não funciona, mas uma coisa que nós desde que fomos para o estúdio decidimos foi privilegiar os sons de cada elemento, de cada instrumento, de cada voz. Isso obrigou-nos um bocadinho a retrair na própria distorção. Depois achámos interessante, como o disco acabou por ser mais trabalhado que os outros, em termos de dinâmicas, o facto de não se ter sempre distorção. Sermos mais regrados na distorção acabou por influenciar a dinâmica do disco. Mas foi uma opção estética, de produção. Vocês ouviram aqui as músicas e se calhar não soam tão limpas, ao vivo já é outra coisa. Depois de gravar, quando começámos a ensaiar, reparámos que as músicas estavam com mais “brita”, com mais power.
As letras, um pouco como no Turbo Lento, passam pelos desabafos sociais. Noutras canções, fala-se sobre casais e paternidade. De que forma tem a experiência adulta afectado a música que vocês fazem?
André: Por acaso é uma coisa que tem sido recorrente nas entrevistas para este disco, de se falar dessa ideia dos temas sociais ou da crítica social. Este disco é capaz de ter as letras mais pessoais. Claro que são sempre feitas com um ponto de vista pessoal, obviamente reflecte-se aquilo que nos rodeia, mas acho que isso não é uma coisa que tenha mudado muito – em relação aos outros discos. Há mais voz, sim, há mais coisas cantadas porque achámos que desta vez as músicas o pediam. Não houve outra razão e os temas em si acho que continuam a ser muito pessoais. Agora, se as fases da vida nos afectam? Afectam como tudo, como também afectam aos outros no seu trabalho, nas relações que têm com as pessoas, as experiências que se vive acabam por nos moldar. É só essa a influência que têm.
Passaram mais de 10 anos desde que começaram a tocar. Vários discos, vários EPs, há ainda alguma coisa que sentem que têm para dizer, há muitas ideias para explorar?
Pedro: Isso é uma cena fixe, com o espaço novo e o termos mais tempo. Aconteceu que nós temos músicas que não ficaram no disco e isso é bom sinal. Quer dizer que estamos a trabalhar e estamos com vontade de continuar a explorar. Foi o que aconteceu com o Sirumba, essa exploração de ver por que caminho é que vamos sem nos repetirmos. E o facto de termos uma sala de ensaios, só nossa, com o nosso material lá, dá-nos pelo menos as condições para continuar com novas ideias, fazer novas músicas.
André: Há uma coisa que é verdade: quando se acaba de fazer um disco, o processo em si é longo e é tão esgotante, do ponto de vista do trabalho e do empenho pessoal que cada um de nós mete, que depois do disco estar feito e ser entregue para a fábrica, chega a um momento em que se sente uma exaustão criativa. Nesse momento a seguir não dá vontade de fazer logo músicas. E, se calhar, quando começas a compor, no momento seguinte, em que tens cabeça para isso, aí assalta-te um bocado essa dúvida: será que eu consigo fazer isto outra vez? Para onde é que eu vou? Mas de facto, como o Pedro estava a dizer, desta vez o tempo foi fundamental para isso. Porque é preciso tempo, espaço, primeiro para se cair na zona de conforto e só depois conseguir pular fora. Nos outros discos nunca tínhamos tido essa distância e esse tempo que é necessário, então muitas vezes acabávamos por fazer coisas que estavam mais dentro da nossa “caixa”. Desta vez isso revelou-se como um bom instrumento para a criatividade – tivemos espaço, tivemos tempo, podemos tocar hoje e amanhã não, estamos todos dedicados àquilo e isso foi uma diferença fundamental.
Quais são as expectativas para os concertos que aí vêm e para a recepção ao disco?
André: São as melhores, queremos tocar.
Pedro: Nós temos muita vontade de tocar o disco, ficámos contentes com o resultado e a expectativa é essa, tocar.
Cláudia: E expectativa que o público goste e continue a gostar dos concertos como gostava antes. Espero que as pessoas de repente não pensem: “ah, afinal já não gosto disto”.
Pedro: Sim, a banda não muda.
Cláudia: A banda não vai mudar, mas a minha expectativa é essa, que os concertos sejam divertidos. Neste momento, como ainda estamos a ensaiar as músicas, para mim ainda é complicado estar à vontade a tocá-las, porque estou preocupada com outras coisas, como acho que estamos todos. Quando as músicas são novas, está-se sempre preocupado com uma série de coisas: Depois elas começam a entranhar-se e passa-se a estar muito mais à vontade. Espero que, a partir do momento em que a coisa esteja à vontade, os concertos corram como corriam antes, ou melhor.
Os Linda Martini tocam amanhã (sábado, dia 2 de Abril) no Coliseu dos Recreios, em Lisboa. Os bilhetes têm o preço único de 12€, com bilhetes duplos ao preço inferior de 20€, podendo ser adquiridos nos locais habituais.