Num Domingo marcado por ansiedades eleitorais, um pequeno submundo de catarse acontecia dentro das paredes negras do Lisboa Ao Vivo.
Antecedidos pelos espanhóis Boneflower – que em Janeiro passaram pela mesma sala a abrir para Touché Amoré – e pelos californianos Modern Color, também eles da cena pós-hardcore (mas com laivos mais vincados de shoegaze), os seus conterrâneos Scowl apresentaram o seu novo álbum Are We All Angels.
Lançado a 4 de Abril, o segundo disco da banda é editado pela Dean Ocean, casa para artistas como Phoebe Bridgers e Mitski, deixando para trás a relação com a Flatspot Records, editora independente de Baltimore que tem procurado dar espaço a novos músicos do panorama punk e hardcore, e que abriu caminho para o seu álbum de estreia em 2021. Ainda obedecendo aos cânones que esses géneros pressupõem, How Flowers Grow trouxe uma cara lavada ao estilo que juntou Kat Moss, Malachi Greene, Mikey Bifolco, Bailey Lupo e Cole Gilbert.
O novo álbum, pelo contrário, trouxe um lado mais melódico, substituindo muitos dos berros por refrões catchy de voz doce, mas ainda revoltada. Kat assume esta mudança como propositada, como o amadurecimento que pretende quebrar com padrões tradicionais; certamente o mais perto de encontro identitário entre as suas referências e as suas lutas pessoais. Com o seu cabelo verde fluorescente, a destoar com as cores negras da banda e do público, Moss cantou com amor e masoquismo. Are We All Angels pede mais isso. Ainda que não consigam (nem queiram) amochar o seu lado mais cortante, é inegável que as suas dores encontraram outro veículo nas músicas que compõem. E ainda que a plateia se fizesse pequena, para além do óbvio mosh (mais tempestuoso nas faixas mais antigas), houve também vozes de compreensão e de sofrimento partilhado, com destaque para temas como “Special” e “Not Hell, Not Heaven”, ou o single de 2023 “Shot Down”.
Num concerto dedicado ao novo álbum, e que se fez curto face à vontade de os ouvir – com canções tocadas em velocidade furiosa – os Scowl conseguiram ainda fazer exteriorizar alguns demónios. Com uma voz menos acutilante e mais dorida, Moss pariu a sua vulnerabilidade como deleite de outrém. E sabe bem ser esse outrém.
Fotografias: Francisco Fidalgo

















