
Diz-se que a vida é uma viagem e, Cass McCombs, no seu género nómada, errante, é um daqueles personagens a quem o dizer ultrapassa as palavras. Talvez não a despropósito iniciou o concerto no Maria Matos com “County Line”, aquela linha de fronteira de divide uma região mas que não é obstáculo para chegar à seguinte; na música do californiano cabem quase todas as américas e quase todos os géneros musicais, do folk ao rock, ao country, ao blues, a baladas com um nível de intimidade na voz e nos sons que deixa como que dormentes (no bom sentido), e vai viajando entre eles.
Os temas que se seguiram no concerto de sexta-feira, em Lisboa, mostraram na perfeição esse caminho. Os acordes de “Love Thine Enemy” foram os segundos a ecoar na sala, antes de a banda apresentar os primeiros temas do mais recente trabalho Big Wheel and Others, o sétimo do californiano, concretamente “Name Written in Water”, “Big Wheal” e “Angel Blood”, tema onde McCombs troca a guitarra pela viola, que o acompanhará praticamente até final.
Uma sala cheia, o palco despojado e um cantor de escassas palavras para a audiência… talvez se perca algo em intimidade, talvez seja do inverno lá fora, ou de longas estradas desertas nos Estados Unidos que nos surgem na memória…ou então este contador de histórias guarda todas as palavras para enriquecer os temas que compõe (e ouvindo com atenção encontram-se pérolas enormes).
O concerto segue viagem com McCombs a levar-nos a revisitar toda a sua discografia; cerca de uma década de carreira e sete álbuns – o último um duplo, com 22 canções – e onde se revela mais um dos momentos altos da noite “Dreams Come True Girl”, recebido com aplausos pelo público, do álbum Catacombs (de 2009).
A primeira despedida chega com “Sacred Heart”; a banda volta para mais um tema, antecedido de um género de desafio por parte do californiano: “se ainda não tiveram oportunidade de dançar esta é a última”. Diria que meia dúzia se levantou para agitar ligeiramente o corpo há cerca de 1h15 sentado na cadeira. O concerto chegou ao fim ao som de “Lionkiller Got Married”… uma viagem que por vezes me levou à estrada do Pacífico, que serpenteia o mar, e ao interior dos Estados Unidos, nas rectas a perder de vista que rasgam desertos que parecem não ter fim. Lembrei-me de Kerouac e do seu livro “On the Road”… se fosse música talvez tivesse a alma de McCombs.
* fotos de Luís Martins gentilmente cedidas pelo Teatro Maria Matos