Pink Opake e So Dead iluminaram de negro a sala do Bota. Fechámos os olhos e deixámo-nos levar pelo balanço e o tempo passou rápido de tão doce que foi!
No ano passado, o nosso Duarte Pinto Coelho partilhou com a redação do Altamont uma das delícias do seu Grande Almoço Português! Play me like a Doll (2024), o segundo álbum dos conimbricenses So Dead soava excitadamente diferente do que andava a ouvir e o bicho ficou cá, até porque essa descoberta permitiu ter (finalmente) chegado ao belo trabalho de estreia, Wait to Die, lançado apenas no ano anterior.
O trio Sofia Leonor (voz e baixo), Miguel Padilha (voz e sintetizadores) e Samuel Nejati (bateria) produz uma mistura personalizada de uma vasta paleta de estilos e sons (Synth Wave, Post-Punk, Punk e simplesmente Rock ‘n’Roll), a puxar para a pista de dança íntima e escura que ocupa as minhas belas memórias do Limbo (Bairro Alto) no início do século, ou para andar por casa de auscultadores na cabeça!
E produzir parece ser mesmo uma pulsão para a banda, pois passado menos de um ano, já cá está outro. A Wet Dream and a Pistol ( acabadinho de rever pelo nosso Tiago Crispim) saíu no fim de maio e é até agora o meu preferido! Se a vontade de os apanhar ao vivo já era muita, rapidamente passou a sonho molhado, salvo seja! Felizmente chegou a noite e felizmente foi no Bota, pois as saudades já eram muitas.
O concerto arranca animado, como seria de esperar, com duas novas (“They Live” e “BDSM”) e mais uma de cada uma das rodelas anteriores, mas é já com Henrique Alvarez (Birds are Indie) em palco, na guitarra elétrica, que o som e a vibração da sala explodem. A sequência de quatro das faixas de Wet Dream (“Rowing”, “I shot JFK”, “Push” e “Creeper”) é brilhante e só dá vontade de balançar de olhos fechados por toda a sala! Lindo! O quase nowave de “Sleep Mode” acalma-me um pouco e faz-me abrir os olhos para apreciar a entrega vocal (e não só) de Miguel Padilha. A atuação acaba (já ???) com a gótica “Charcoal Heart” para continuar a alimentar o bicho!
Confesso que só fiquei a conhecer os Pink Opake por causa do cartaz do Bota, mas foi mais uma daquelas belas coincidências mágicas que nos vão acontecendo de tempos a tempos. Matéria (2023), o primeiro e único registo da banda até ao momento, tem passado repetidamente cá em casa nas últimas 2 semanas e a curiosidade era mais do que muita. Depois de atuar no Extramuralhas, em Leiria, vieram até Lisboa e quem foi ver, não se terá, com toda a certeza, arrependido!
Apesar da novidade do projeto, os fundadores dos Pink Opake já são figuras maiores da cena alternativa de São Paulo, Paulo Beto (guitarra e sintetizadores) e Tatiana Meyer (voz e sintetizadores) fazem parte do emblemático colectivo Anvil Fx, onde foram aprimorando esta brilhante fusão entre a sonoridade gélida do coldwave de tradição europeia com a musicalidade quente e livre do Brasil.
Contando agora com a contribuição de Mari Crestani (baixo e saxofone), os Pink Opake acrescentam sombras e, sobretudo, muita textura ao seu legado dos Anvil Fx! O trabalho de Paulo na guitarra é deslumbrante, até na sua aparente simplicidade, casando na perfeição ora com os sons maquinais dos sintetizadores e com a entrega vocal enérgica e cheia de alma de Tatiana, ora com o saxofone de Mari, que reforça a tal textura e leva-a a novas dimensões, principalmente quando no seu registo mais doido e mais livre, como em “Eu não sei” onde acrescenta uns pós de noise a esta fabulosa composição.
O alinhamento visitou gemas de Matéria, como o tema título, “A luz não passa”, “Minha voz Minha vez”, a pujante “A pátria é Nada” com que finalizaram o concerto e a militante “Pronta”, que Tatiana recitou em discurso direto a cada um de nós na sala do Bota. Passou igualmente por uma série de canções que não descobri de onde vinham e que me deixaram a salivar com um disco novo … talvez … por favor!
Fotografias: Rui Gato























