Para quem anda nestas andanças da música electrónica (e dos seus infindáveis satélites), Autechre é seguramente um nome que não passou despercebido. Este duo inglês dos arredores de Manchester, formado em 1987, já produziu tantas viagens quantas possamos imaginar. Desde álbuns a EP’s, entre singles, promos e remixes, Rob Brown e Sean Booth são dois rostos incontornáveis daquilo que foi possível fazer com as máquinas nas últimas décadas da nossa existência. Maioritariamente associados à IDM (intelligent dance music), não obstante, os Autechre têm vindo a posicionar-se cada vez mais no extremo experimentalista da música electrónica. Mas o tema que eu vos proponho data de 1995, ano em que foi lançado o terceiro álbum do grupo, entitulado de “Tri Repetea”. Este disco (e não tem nada a ver com o facto de ser fanático pelo número três), apresenta-se talvez como a obra mais integrante do grupo. São 73 minutos de pura endurance psíquica. Poder-se-ía mesmo afirmar que se trata de um triângulo invertido que se começa a construir do vértice para a base. Sons mecânicos e repetitivos. Há até alguns críticos que dizem que este disco parece ter sido feito directamente por máquinas, sem intervenção humana. Há melodias, mas os sons incorporam uma austeridade implacável. Põe-se então a questão: será isto música feita por computadores, apenas audível por computadores? A resposta não podia ser mais tácita. Claro que não! Nem tudo pode ou precisa de ser falado ou expresso por palavras. Pois a dinâmica mecânica dos Autechre é sobretudo espontânea, intuitiva, experimental. E afinal os computadores não são uma invenção do Homem? Ou serão eles descendentes de seres alianigenas provenientes de outras galáxias? A austeridade presente neste trabalho, e especialmente neste tema, deve ser lida não como uma deficiência mas sim como um dote particular e sobre-desenvolvido. Soberbamente pensada e desenhada pelos The designer Republic, a capa do disco é o corolário de tudo o que antes de chegar a disco foi pensado. Um épico binário de proporções para-normais…
Periferia: Autechre

João Afonso
Se me perguntassem hoje o que é que queres ser, eu diria não sei. Mas há duas outras três coisas que tenho a certeza absoluta. Uma delas é a música. Nunca aprendi por achar uma seca ler pautas. Por isso prefiro tocar de ouvido. E ouvir muita, muita música! De A a Z, até enjoar. O que acaba por nunca acontecer. E daqui poderia partir para uma teorização mais ou menos filosófica do que é a música. Ora, vou poupar-vos a esse desmazelo retórico. Tirem-me o cabelo, tirem-me o bacalhau, tirem-me a viagem de um mês à Nova Zelândia, mas por favor não me tirem a música. Isso não…
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