Noite mais tranquila, mas não menos intensa em Paredes de Coura, com Slowdive e Kevin Morby a arrebatarem um público insaciável.
A entrada do terceiro dia deu-se ao som dos Smartini, banda de Guimarães (Caldas das Taipas, para ser mais preciso e como o vocalista fez questão de realçar) com sonridade dentro do indierock experimental, e já com muito calo, já que se formaram em 1992. Trouxeram o recente EP Liquid Peace, e mostraram-se à vontade em palco, apesar de algum feedback a dificultar a coisa.
Pouco depois, já no palco principal, Lucy Dacus deu um concerto morno, abrindo com “Addictions”, passando em revista o álbum deste ano Historians, que lhe tem atraído algumas críticas favoráveis. A cantora de Richmond, Virginia assumiu alguma surpresa por existir no público quem já soubesse acompanhar algumas das suas letras, mesmo sendo a primeira vez em Portugal. “Yours & Mine” e um final com a cativante “Night Shift” foram bem servidas em registo de concerto para se apreciar sentado na relva.
Kevin Morby já não é nenhum estranho para qualquer fã de música indie. O músico, que tem passado várias vezes por Portugal nos últimos anos, voltou com um concerto impressionante na sua capacidade de transmitir emoção sem grandes truques ou complexidades, tendo vestindo literalmente o fato-macaco para o efeito. Arrancando com o crescendo de “City Music”, passando pela homenagem aos Ramones em “1234”, e indo à tranquilidade imersiva de “Dry Your Eyes” (onde o público soube respeitar a intensidade do momento ficando totalmente silencioso), o antigo baixista dos Woods soube agarrar o público. Desde o groove pantanoso de “Harlem River” do seu disco de estreia com o mesmo nome até ao sentimentalismo de “Parade”, nenhuma música soava indistinta. O line-up de duas guitarras, baixo e bateria poderia ser uma combinação demasiado genérica não fosse o apuradíssimo sentido de Morby para a melodia, e um dos grandes momentos do concerto foi mesmo uma jam session improvisada de bateria e trompete a dar um toque jazzístico, abrilhantando o mesmo. Do início ao fim, um concerto irrepreensível.
Greta Kline, lider dos Frankie Cosmos, tem o raro dom de fazer o ouvinte sentir que cada música foi escrita exclusivamente para si. A nova-iorquina não conseguiu esconder a sua surpresa ao aperceber-se do nível de afeto que o público, que cantou praticamente todas as músicas em uníssono, tinha pela sua banda.
Num set que consistiu maioritariamente por músicas do seu último álbum, Vessel, houve também tempo para trazer aos fãs portugueses algumas das suas músicas mais acarinhadas como “If I Had a Dog”, “Outside with the Cuties” e “Fool”. Nos últimos minutos do concerto Luke Pyenson, aparentemente sentiu-se mal e abandonou o palco. Greta e Lauren Martin, a teclista/guitarrista aproveitaram para tornar o concerto numa experiência ainda mais íntima, com um breve set sem secção rítmica.
Eis chegada a hora dos DIIV, que fizeram de Paredes de Coura a sua data única para a Europa este verão (louvável, no mínimo)! Tendo como pano de fundo home footage muito possivelmente gravada pelo próprio Zachary, fez-nos sentir como se estivéssemos nos saudosos anos 90, quer pela qualidade de imagem, quer pelas constantes “aparições” dos Nirvana. O som dos DIIV, esse já é mais lato em termos de influências, indo até mais atrás a uns Cure para criarem a sua própria palete sonora. Por entre agradecimentos aos patrocinadores e organização em tons de brincadeira, Zachary e seus comparsas foram saltitando entre temas de Oshin (2012) e de Is This Is Are (2016). Não deixou de ser irónico ter dito que “Doused”, que foi utilizada num anúncio da NOS, se chamava Vodafone. O tempo foi uma preocupação constante em Zachary (perdeu um pouco a mais a trocar corda partida e depois afinar a guitarra pouco após o início) mas conseguiu geri-lo para apresentar uma música nova, que, apesar do nervosismo inicial, correu bastante bem como proferiu o baixista Colin Caulfield. No fundo, tudo correu bastante bem, até ao final com “Wait” (com passagens por “Horses” de Patti Smith e “My Molly” de Ariel Pink), tendo superado a prova de estarem perante o maior público de sempre da sua carreira, em horário nobre e saído sobre uma calorosa ovação.
Com um novo álbum homónimo, lançado no ano passado, os Slowdive entraram no palco Vodafone prontos para dar um grande concerto sem se apoiarem exclusivamente na nostalgia dos fãs. “Slomo”, do último disco abriu o concerto e ditou o tom que reinaria durante todo o concerto: uma tempestade de neve de guitarras reverberantes inundou anfiteatro numa experiência verdadeiramente espiritual. Neil Halstead e Rachel Goswell encontram, nas novas músicas mais espaço para os seus vocais que têm uma maior proeminência do que nas músicas mais antigas do grupo. Os discos clássicos foram lembrados em temas como “Catch the Breeze”, When the Sun Hits e “Alison”, todas elas fazendo as delícias dos fãs. A cover de “Golden Hair” de Syd Barrett, como já é tradição, encerrou o concerto de forma sublime.
Tal como no dia anterior, o terceiro dia do Paredes de Coura deixou o peso pesado para mais tarde. Skepta, apoiado pelo DJ Maximum, trouxe consigo o grime mais sujo de Londres e tal como ele prometeu “it got grimey”. O rapper londrino cuspia as suas rimas freneticamente, assumindo o controlo total do seu espetáculo e do público que esteve a altura, vociferando vigorosamente os refrões de “It Ain’t Safe” e “Shutdown”. Depois de uma versão de “Praise the Lord (Da Shine)” de ASAP Rocky, Shorty tomou brevemente as rédeas, assumindo o papel de hype man. Apesar de uma breve interrupção (devido a um copo de plástico ter sido atirado ao palco ter levado a advertência por parte do rapper para que tal não se repetisse) Skepta saiu do palco agradecido e feliz deixando para trás um público extasiado.
Mais para o fim da noite ainda houve tempo para as activistas Pussy Riot darem um ar da sua graça, com mais guerrilha que música.
Texto: Miguel Moura e Alexandre Pires || Fotografia: Inês Silva