De acordo com a mitologia grega, os titãs fazem parte de um grupo de divindades que enfrentaram Zeus e outros deuses olímpicos na subida ao poder. Numa leitura mais aprofundada, a «Titanomaquia» está directamente relacionada com os mitos em que uma geração de deuses confronta os dominantes. Filhos de Úrano e Gaia, o caminho dos titãs é uma longa estrada de vitórias e derrotas no panorama dos deuses. Nenhum nome poderia ser mais adequado do que este à história de uma das mais carismáticas bandas de rock de sempre no Brasil. Inconformistas, desafiadores, rebeldes, talentosos, independentes, os Titãs conseguiram formar um pequeno Olimpo, um lugar nos céus da criatividade, uma casa imortal onde as individualidades entram apenas e só para servir o colectivo.
Tudo começa em São Paulo nos finais dos anos 70, no colégio Equipe, onde a maioria se conhece. A partir de uma apresentação na Biblioteca Mário de Andrade em 1981, surgem as primeiras actuações em casas nocturnas com o nome inicial de Titãs do Iê-Iê. A primeira equipa é composta por Sérgio Britto, Arnaldo Antunes, Paulo Miklos, Marcelo Fromer, Nando Reis, Ciro Pessoa e Tony Bellotto. Mais tarde o baterista André Jung. E, logo de início, uma característica que irá marcar a originalidade da banda fica vincada. Trata-se da versatilidade de todos os seus elementos. Todos cantam, todos tocam guitarras ou outros instrumentos. No início apresentam-se com um visual extravagante, pontuado por maquilhagem, penteados estranhos e casacos e gravatas às bolinhas. Gravam o primeiro disco em 1984 para a WEA. O nome oficial passa apenas a Titãs e sai Ciro Pessoa. O primeiro disco, Titãs fica desde logo marcado pelos êxitos de «Sonífera Ilha», «Toda Cor», «Marvin» e «Go Back». Ainda no ano de 1984, o baterista André Jung deixa a banda e é substituído por Charles Garvin. O segundo trabalho é produzido por Lulu Santos e tem o nome de Televisão. Nessa altura a banda revela-se um fenómeno muito mais virado para o palco e as actuações ao vivo do que para o estúdio. As vendas são fracas apesar da adesão do público nos espectáculos. Em Novembro de 1985 a banda é abalada por uma ocorrência extremamente negativa. Tony Bellotto e Arnaldo Antunes são presos por posse e tráfico de heroína, um acontecimento que abala a popularidade da banda. De regresso ao estúdio, a entrada de um novo produtor na equipa (Liminha) deu um novo alento e, de certa forma, refrescar a vida da banda. De facto, com esta nova aquisição a banda consegue transportar para as gravações o peso e a versatilidade daquilo que já havia mostrado em palco. Durante os três discos seguintes a parceria Liminha / Titãs vai ser o momento decisivo na história da banda.
CABEÇA DINOSSAURO / O QUÊ ? / JESUS NÃO TEM DENTES NO PAÍS DOS BANGUELAS
Considerado um dos seus melhores trabalhos, bem como um dos mais importantes da história de todo o rock brasileiro, Cabeça Dinossauro sai no ano de 1986. Com um sonoridade mais agressiva de influência punk, está aberto o ataque directo e sem tréguas à hipocrisia da sociedade da época. Os alvos são as principais instituições como «Estado Violência», «Polícia», «Família» e «Igreja». Letras agressivas debaixo de uma sonoridade dura levam Cabeça Dinossauro a ser censurado nas rádios e nas televisões. Em contrapartida nos espectáculos a multidão é cada vez maior, sabe as músicas de cor, compra os discos na rua. Rapidamente os Titãs chegam ao primeiro Disco de Ouro. Rendendo-se à evidência do sucesso, as rádios começam a tocar as faixas de Cabeça Dinossauro. Algumas preferem mesmo pagar multas para passar faixas como «Bichos Escrotos». Com este álbum, os espectáculos aumentam, e as portas da comunicação social abrem-se definitivamente, marcando aqui o momento decisivo na carreira da banda. A experimentação em palco de samplers e da música electrónica vão ser uma imagem da marca para o trabalho seguinte, O Quê?. Aclamados pelo público, crítica e ainda por nomes tão importantes como Caetano Veloso e Legião Urbana, os Titãs vão para o estúdio em grande estilo. Jesus Não Tem Dentes No País dos Banguelas prossegue a utilização de samplers e da bateria electrónica em temas como «Diversão», «Corações e Mentes» ou «Comida». Na linha do trabalho anterior, sobressaem também «Lugar Nenhum», «Nome aos Bois» e «Desordem». Com estes três álbuns de parceria com o produtor Liminha, os Titãs conquistam e reforçam o seu lugar no panteão das grandes bandas do Brasil.
Após algumas apresentações internacionais, a banda grava ao vivo uma selecção de músicas antigas e lança Go Back em nova versão. A parceria com Liminha consolida-se em Õ Blésq Blom em Setembro de 1989, sendo uma das produções de maior êxito até então. Nela destacam-se temas como «Miséria», «Flores», «O Pulso» e «32 Dentes». Neste trabalho há a destacar a curiosidade de incluir a participação especial de um casal repentista (cantores de quadras ao desafio e improvisadas) de Pernambuco, Mauro e Quitéria, descobertos pela banda numa praia do Recife.
NOVOS CAMINHOS / FRACASSOS / PAUSAS
Em 1991 Tudo Ao Mesmo Tempo Agora foi um choque mesmo para os mais indefectíveis da banda. Os Titãs sentem a falta do velho rock n’ roll. Interrompem a parceria com Liminha e decidem autoproduzir-se. O regresso ao estilo roqueiro é levado ao extremo com guitarras distorcidas e letras bastante agressivas. O fracasso comercial é a porta de saída de Arnaldo Antunes que passa para uma carreira a solo. Apesar de tudo a faixa «Será que É Isso que Eu Necessito» ganha o Video Music Awards da MTV. A banda não se deixa desanimar e em 1993 lança Titanomaquia, uma continuação do trabalho anterior. Produzido por Jack Endino (Nirvana, Soundgarden, etc.), mantém-se a sonoridade pesada e as letras agressivas. Apesar de a comunicação social se mostrar mais receptiva, as vendas continuam baixas.
No fim da tournée de Titanomaquia, a banda decide tirar um ano de férias para que cada um se possa dedicar aos seus projectos pessoais. Miklos e Nando Reis lançam discos a solo, Tony Bellotto escreve o seu primeiro livro, Marcelo Fromer produz trabalhos doutros músicos, e Charles Gavin vai para Londres fazer uma curso de produção.
Em 1995 os Titãs estão de regresso com Domingo, num registo mais próximo do pop. Embora o som se mantenha pesado, o conteúdo lírico é muito menos agressivo. Disco de Ouro desse ano, o álbum inclui pela primeira vez um tema que não tinha sido composto pela banda. Trata-se de «Eu Não Aguento», da Banda Tiroteio. Domingo conta ainda com as participações especiais de nomes como Herbert Vianna, João Baronne, Andreas Kisser e Igor Cavalera.
GLÓRIA E TRAGÉDIA
Para comemorar os 15 anos de carreira, os Titãs gravam no Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro, um trabalho acústico para a MTV. Considerado o melhor de trabalho de toda a sua carreira (1,7 milhões de cópias vendidas), a banda apresenta-se com um grupo de cordas e outro de metais de suporte. Outra novidade foi o facto de o antigo produtor Liminha aparecer integrado a tocar com a banda; nada que não tivesse ocorrido em ocasiões anteriores. O disco revisita temas antigos e apresenta vários inéditos como «Os Cegos do Castelo», «Nem 5 Minutos Guardados», «A Melhor Forma» e «Não Vou Lutar». São convidados dos Titãs para este trabalho nomes como Rita Lee, Marisa Monte, Jimmy Cliff, Fito Paez, Marina Lima e Arnaldo Antunes.
Tentando aproveitar o sucesso do acústico em 1998, editam Volume Dois, onde apresentam novas versões de temas antigos misturados com temas inéditos. Apesar das críticas generalizadamente negativas, as vendas correm bem. Volume Dois recebe o Troféu Imprensa para o melhor conjunto musical daquele ano.
1999 apresenta o primeiro trabalho dos Titãs não autoral, em que a banda canta canções de outros compositores como Tim Maia, Roberto Carlos e Raul Seixas e bandas como Legião Urbana e Ultraje a Rigor. Acusados de ter embarcado numa cedência ao mercado, são arrasados pela crítica apesar de as vendas terem corrido bem.
Em 2001, dias antes de entrar em estúdio para novas gravações, o guitarrista Marcelo Fromer é atropelado por uma moto em São Paulo. Morre dois dias depois. Começam a correr rumores acerca do fim da banda.
Depois de muito reflectirem (afinal Fromer era o guitarrista principal da banda), os Titãs decidem continuar. A Melhor Banda de Todos Os tempos da Última Semana acaba por sair como tinha sido previsto antes da morte de Fromer. Novos sucessos como «O Mundo É Bão Sebastião», «Epitáfio» e «Isso» marcam mais uma agenda repleta de concertos e prémios e a continuação do êxito. Perturbado com a morte de Fromer e da amiga e cantora Cássia Eller, Nando Pais deixa a banda.
Em 2003 Como Estão Vocês seguiu na linha pop / rock anterior, apesar de vender menos. Em 2005, para comemorar os 25 anos de carreira, é lançado o terceiro disco ao vivo MTV Ao Vivo, que se irá prolongar até 2007 com vários espectáculos conjuntos com os Paralamas do Sucesso. Em 2009 estreia o filme documental A Vida Até Parece Uma Festa sobre a banda.
Em 2009 Rick Bonadio produz para a Arsenal Music Sacos de Plástico, com distribuição da Universal Music. A banda deixa para trás os músicos de apoio e fica reduzida a apenas cinco elementos. Um ano depois é a vez de sair Charles Garvin.
Em 2011 os Titãs voltam aos palcos no Rock in Rio, tocando ao lado dos Paralamas e também dos Xutos e Pontapés.
Entre 2013 e 2014 tocam alguns novos temas na tour Titãs Inédito. Em Abril de 2014 anunciam um novo trabalho, Nheengatu, que será lançado em Maio do mesmo ano.
Como vimos, a marca dos Titãs conquistou há muito o seu lugar no meio dos deuses do rock n’ roll. A sua imagem ficará para sempre enquanto referência, lenda, magia e versatilidade de uma rara conjugação de muitos talentos.