Micah P. Hinson é um gajo com estilo. É habitual vê-lo com o seu chapéu de cowboy e o cigarro no canto da boca. Nada de estranhar, portanto, quando foi assim que o vimos subir ao palco do Musicbox, no passado dia 10 de maio.
A sua vinda a Lisboa é muito esperada (a última foi em 2019), facilitada pelo facto do músico estar actualmente a viver em Madrid e veio a pretexto de celebrar os 20 anos do fabuloso álbum Micah P. Hinson and the Gospel of Progress, de 2004.
Subindo calmamente em palco com a sua guitarra acústica, apresenta-se (sob um mar de aplausos) dizendo-nos que é de Memphis, Tennessee, mas que cresceu no Texas e que foi obrigado a tocar Country (nós agradecemos). De origem Chickasaw, Hinson teve um arranque de vida atribulado (o próprio faz referência a isso), tendo referências musicais como The Cure, mas não conseguiu escapar ao estilo mais Americana e Folk-country (e ainda bem!).
O seu primeiro álbum, que serviu de mote a esta celebração em Lisboa, está recheado de temas de amores, desamores, arrependimento, isolamento, canções de uma delicadeza que nunca colidem com a sua voz grave e reconfortante. Contudo, como o próprio confessou em pleno concerto, é um disco que ele escreveu “when I was a child. Of course I like it, but I’m not that person anymore. And I won’t be playing some of the songs”.
E, de facto, este álbum tem 14 músicas e hão de ter sido tocadas cerca de metade. Sem problema, o público manteve-se completamente embevecido pelo músico.
A certa altura, alguém pergunta “Hey, Micah, does that guitar kills fascists?” Se dúvidas houvessem, a resposta foi bastante clara: “Hell yeah, but before it was an idea that didn’t seem real…”. Também disse “the revolution has to start somewhere” e que melhor maneira do que a mesma começar com uns acordes de guitarra?
Micah P. Hinson tem uma aura muito man in black, até a forma como agarra na guitarra é muito Johnny Cash (RIP), algo intimidatório (olhar intenso e aquele cigarro no canto da boca), ao mesmo tempo que transmite uma amabilidade e abertura desconcertantes. Poder assistir a um concerto do músico é qualquer coisa de muito especial.
Sempre com um sentido de humor mordaz, uma ou outra vez atrapalha-se, não faz mal, o público perdoa-lhe tudo (já sabemos que o álbum tem 20 anos). A sua presença é de uma intimidade bastante bonita e vulnerável, permitindo sentir que estávamos entre amigos (“I feel embarrassed for even playing this song for you. Wild memories. Oh man it’s so embarrassing, but here it goes” mesmo antes de cantar a “I Still Remember”).
Ao longo da noite foi claro que Micah P. Hinson sentia-se algo desconfortável com as músicas antigas (“It’s as if I was reading my diary from 30 years before. Would you like to read your diaries?”), mas, a verdade é que são músicas maravilhosas e todos os que ali estavam as queriam ouvir.
Ainda houve oportunidade de ouvir duas músicas novas (“proper Disneyland shit, orchestra [recorded] in Italy” – queremos muito ouvir este novo álbum) e o clássico “Please Daddy, Don’t Get Drunk This Christmas”.
Ouvir Micah P. Hinson ao vivo é uma experiência íntima e acolhedora, uma vez que o cantor partilha muito da sua história, e faz-nos sentir muito próximos (a propósito, a certa altura diz “I married a wonderful woman on December 31st. Where are you, darling?” luzes acendem-se e no fim do bar, uma mulher ri-se. A-d-o-r-á-v-e-l).
Foi um concerto muito especial. Para nós serás sempre mais do que apenas um “country singer”, Micah.
fotos em atualização