Na Culturgest, os Mão Morta apresentaram Viva La Muerte! com a intensidade de um manifesto. Num espetáculo carregado de simbolismo, a banda transformou a arte num grito de resistência contra os fantasmas do autoritarismo.
Banda de culto há décadas, os Mão Morta subiram ao palco para um concerto único – e esgotado há meses – onde a música se fundiu com a política e a provocação. Este espetáculo marcou a apresentação ao vivo do mais recente álbum da banda, Viva La Muerte!, um disco conceptual composto por nove faixas concebidas especificamente para a performance.
Quando a cortina se ergueu, Adolfo Luxúria Canibal e os seus camaradas já estavam perfilados em palco, trajando um visual carregado de significado: fardas e botas militares, bonés e, no braço do vocalista, uma faixa negra de luto – talvez pelos valores democráticos nas sociedades ocidentais.
As palavras de resistência emergiam do palco – cantadas, sussurradas, gritadas. “Bem-vindos ao espectro do fascismo”, lançou Adolfo a meio do concerto, na única vez que a banda se dirigiu ao público. Mas também, que atores se preocupam em saudar a audiência antes de mergulharem na personagem?
Adolfo, maestro de uma cerimónia sombria, dançava em espasmos descontrolados, enquanto a banda desenrolava um repertório que oscilava entre a crueza do rock e a densidade das camadas instrumentais e vocais.
O espetáculo Viva La Muerte! estava inicialmente planeado para 2024 – ano em que se assinalam os 50 anos do 25 de Abril e os 40 anos dos Mão Morta –, mas é em 2025 que a banda nos trouxe a sua visão sobre o ultranacionalismo, a ascensão de teorias conspiracionistas, o desprezo pelo conhecimento científico e o apelo ao pensamento totalitário, sempre com os olhos postos na liberdade e na democracia.
Se as verdades demasiado atuais ditas pelos Mão Morta arrepiam, também despertam a consciência de que é preciso lutar e levantar punhos cerrados. As palavras repetidas como um mantra – “ninguém nasceu para ser servil e morrer” – ecoaram pelo público, que se recusava a deixar que a noite terminasse, muito depois do último acorde.
Os aplausos prolongaram-se, e os Mão Morta regressaram três vezes ao palco para agradecer aquela que não foi apenas uma atuação, mas um verdadeiro manifesto.
Fotografias: Vera Marmelo










