Nome complicado de dizer, música simples de digerir e conquistar – assim podem ser descritos os Hurray for the Riff Raff.
É um daqueles fenómenos que parece já não ocorrer hoje em dia – com tantos canais de onde podem surgir novas descobertas musicais, os Hurray for the Riff Raff nunca se aproximaram de nenhum dos radares que tenho espalhados, qual Câmara Municipal de Lisboa à caça do motorista incauto. E no entanto, eis que existem desde 2007. Eis que já contam com oito álbuns na sua carreira. Eis que Alynda Segarra, que é a banda em si, é um poço de vida e que merece ser escutada.
LIFE ON EARTH surgir em Fevereiro. Como já lá vão uns meses, nem sei precisar como lá cheguei, mas o que importa é que desde então ficou a maturar, sempre em lume brando, aparecendo aqui e ali nas escutas aleatórias a que às vezes recorro para ser surpreendido pelo algoritmo. E as músicas foram entrando, primeiro a provavelmente mais catchy de todas, “RHODODENDRON“, um folk indie saboroso e aconchegante. Seguiu-se um trio de músicas delicadas e subtis que me faziam sempre olhar para o ecrã para ver de quem eram – “LIFE ON EARTH” canção, “ROSEMARY’S TEARS” e “nightqueen” e tornou-se inevitável ouvir o álbum de uma ponta à outra. Recorrentemente. Sucessivamente. Até ser conquistado pela beleza e aparente simplicidade que lhe está inerente em cada canção, em cada recanto, em cada verso que Alynda nos atira.
Segarra podia ser um porta-estandarte, uma amostra física do que é ser americana no século XXI. Com raízes porto riquenhas, cresceu no Bronx mas cedo percebeu que queria mais. Percorreu o país de comboio e boleias, só com uma mochila às costas, descobrindo-o, absorvendo-o, até se decidir por Nova Orleães como poiso para se dedicar à música. Uma “nature punk” como a própria se descreve, activista, não por acaso o nome da banda serve para celebrar os riff raff – forasteiros e indigentes que ameaçavam o status quo: “a ralé, os esquisitos e os poetas, as mulheres rebeldes e as ativistas” que a sociedade desconsidera. De tocar nas ruas aos concertos, aos discos em editoras independentes foi um saltinho e, repetindo-me, eis que já tem oito álbuns na sua bagagem.
Não podia terminar esta crónica sem mencionar a pérola perfeita de LIFE ON EARTH – “PRECIOUS CARGO”, uma ode dedicada aos refugiados e imigrantes que fogem dos seus países em busca de melhores condições de vida. Com uma sonoridade de fundo trip-hop, absorver tudo o que ali é retratado é desolador, inquietante, sobretudo quando entra em “cena” a voz de um detido no I.C.E., os centros de detenção de emigrantes nos EUA onde a própria Alynda passou uns tempos a trabalhar na defesa dos seus direitos.
Neste momento, a poucas semanas de se fechar a votação para os tops do ano, é claro como a água que faz o nosso planeta especial que LIFE ON EARTH lá estará. Quem não o escutou estranhará. Quem por lá passou os ouvidos anuirá.