Os Clã são exímios na arte de receber e de devolver o amor do seu público na mesma medida, trazendo-nos uma noite de beleza rara de entrega e comunhão, com toques de humor e sensualidade. Aos 30 anos de carreira, a banda mostra-nos que é possível renovar-se, reinventar-se e fazer coisas novas.
Quem galgou os caminhos entre a infância, a adolescência e o início da vida adulta ao som de Clã, certamente saberão de olhos fechados, e sem memória traiçoeira, trautear os hinos amorosos da banda portuense. Jovens ou jovens que agora são adultos e pais de jovens, todos viram, em algum momento da sua vida, a banda sonora das suas vidas serem preenchidas pela voz de Manuela Azevedo. Talvez por isso não seja surpreendente que a porta do Musicbox tenha aberto com um papel anunciando “Concerto Esgotado”. Concerto este que serviu para inaugurar uma nova digressão nacional mas para, acima de tudo, celebrar 30 anos de carreira.
Um alinhamento que não só trouxe faixas do mais recente Véspera, lançado em 2020, mas revisitou clássicos do passado e ‘parceiros’ de longa data e celebrou as obras de muitos outros músicos.
Se o início da noite se fez com ‘Museu do Mundo’ (do álbum Corrente), depressa a banda saltou para o presente, com ‘Pensamentos Mágicos’ e ‘A Arte de Faltar à Escola’, cujos versos escritos por Regina Guimarães são, como a vocalista apresentou, uma “homenagem aos mais novos que faltam à escola para defender a casa que é de todos”.
Os Clã são exímios na arte de receber e de devolver o amor do seu público na mesma medida. Com simpatia, leveza, humor e muita generosidade. Talvez por isso não seja surpreendente que uma noite como esta se tenha feito com a presença de dois convidados de luxo. Depois de ‘Ferrugem’, era imprescindível chamar ao palco o seu autor, o jovem alto e perfumado Samuel Úria, com quem cantaram e dançaram então ‘Fusão’, num dueto com groove e sensualidade que atravessava a sala e se reproduzia em todos nós. Mais à frente seria a vez de Tó Trips subir ao palco para nos oferecer um dos momentos mais bonitos da noite, com “Deus Me Dê Grana”, dos Dead Combo.
A banda mostra-nos que, com 30 anos, é possível renovar-se, reinventar-se e fazer coisas novas, seja tocando no Musicbox pela primeira vez ou interpretando canções de outros artistas e dando corpo a homenagens irrepreensíveis. Quem foi ontem ao Musicbox teve a oportunidade de ver não um mas vários concertos e cantar em uníssono as palavras de Sérgio Godinho (“Tudo no Amor”), dos Xutos & Pontapés (“Conta-me Histórias”) ou mesmo Manel Cruz (“O Navio Dela”).
É inexplicável, ou talvez não (quem já teve oportunidade de os ver ao vivo saberá bem do que falo) esta beleza rara de entrega e comunhão. Um público rendido logo desde o início, contaminado pela electricidade com que todos os membros e, claro, pela rainha do palco, foram alimentando ao longo das duas horas de concerto, com dois encores, o último reservado a ‘Problema de Expressão’, trazendo uma profunda memória afectiva da adolescência que pensava estar esquecida.
Ouvimos muitas vezes Manuela Azevedo agradecer, referindo muito o sentimento de estar em casa. E éramos, todos nós em colectivo, uma casa, família, afecto.
Fotografias gentilmente cedidas por João Paulo Wadhoomall
Alinhamento:
- Museu do Mundo
- Pensamentos Mágicos
- A Arte de Faltar à Escola
- Dá o Que Tem
- Basta
- Sinais
- Ferrugem
- Fusão (com Samuel Úria)
- Tempo-Espaço
- Oh, Não! Outra Vez
- Tudo no Amor
- Deus Me Dê Grana (com Tó Trips)
- Conta-me Histórias
- Armário
- GTI (Gentle, Tall & Inteligent)
- Tira a Teima
- A Ver Se Sim
- O Navio Dela
- Dançar na Corda Bamba
Encore
- O Sopro do Coração
- O Big One da Verdade
- Fahrenheit
Encore 2
- Problema de Expressão