“FYI I’m not an R’n’ B artist”.
Foi assim, limpinho de espinhas, que Chet Faker se dirigiu, na sua página de Facebook , aos que o tentam rotular. Dos rótulos não quer saber, mas não pode – nem deve – querer descolar-se da ideia que dele se vai fazendo: um artista soulful, inspirado na antiga Motown, com uma aragem eletrónica que faz dele uma das melhores novidades dos últimos tempos.
Chegou Built on Glass, o primeiro e aguardado longa-duração. Depois do muito bem recebido EP Thinking in Textures que nos serviu um prato cheio, com coisas do calibre de “No Diggity”, uma reinvenção do clássico hip-hop dos Blackstreet dos anos 90.
Nicholas James Murphy, o cantor de apenas 25 anos, emprestou depois a voz a “Left Alone”, tema que fez em colaboração com o produtor Flume. Chet chegou mesmo a dizer que os dois se complementavam numa espécie de “yin e yang”. Os chacras dos dois australianos alinharam-se de tal modo que, no ano passado, acabou por surgir o EP conjunto Lockjaw.
É o momento de Chet brilhar em nome próprio. O apetite já era grande depois do aperitivo “Talk is Cheap”, o primeiro single onde sobressai a voz carregada de murmúrios de desamor. O resto do álbum alinha pelo mesmo diapasão e não desilude. É difícil até de acreditar que não houve nenhum antes deste e que as (poucas) músicas que foi divulgando, ao longo dos últimos três anos, chegaram para evangelizar e encher salas por todo o mundo.
O tempo que demorou até ao primeiro álbum foi para aprimorar o tipo de som que queria fazer e esse som não precisa de ter rótulos, mas pode ter algumas fronteiras que o balizem. No caso de Built on Glass até se pode falar em dois lados distintos, aqui mais claros do que nunca. A divisão acontece com interlúdio “/” onde ouvimos uma voz grave que nos diz: “That was the other side of the record. Now relax still more and drift a little deeper as you listen”. Um lado A que explora a depressão urbana e a melancolia com os pilares assentes na voz e nas teclas, para depois ter um lado B, mais atual, vincadamente eletrónico e onde a dor do amor não tem só a ver com piano.
Não sabe discernir as principais influências musicais (apesar de ter roubado parte do nome a Chet Baker) mas admite que o expurgar de demónios é transversal à sua obra. A solidão, a perda e a fragilidade passam pelas mãos de um grande contador de histórias da eletrónica . É o amor e a falta dele, mas também o corpo e a cama, embrulhados na soul de 2014.
Está dado o tiro de partida para amar Chet Faker. Agora, é ir ver se isto é tudo verdade, a 12 de julho, no Optimus Alive.