Ao terceiro disco, o quinteto de Sintra baralha os seus elementos e volta a dar! E temos mão para apostar forte!
Les gens sont fous, les temps sont flous
Les temps sont flous, les gens sont fous
(Les Gens Sont Fous, Les Temps Sont Flous, Jacques Dutronc [1966] )
Arrisco começar este texto com o refrão da canção de Jacques Dutronc que os Them Flying Monkeys foram buscar para Best Behavior pelo que eu penso que ela representa no todo do disco, mas sobretudo, pelo que não representa. Mas, vamos por partes.
Depois do que considero uma falsa partida em fevereiro de 2024 – mais por culpa minha do que deles, confesso … os concertos atrasaram, a luz estava uma treta para fotografar e a minha paciência esvaiu-se a meio da contenda – já tive a oportunidade de apanhar o quinteto sintrense duas vezes durante este ano. As atuações na Musa, no passado mês de abril, e principalmente no Festival Sons no Montijo, em julho, mostraram uma banda enérgica e bem articulada (tight, como dizem os americanos) capaz de colocar o tipo mais difícil a bater o pé! Em ambas as noites, a versão da canção do francês Jacques Dutronc surgiu como o ponto alto do alinhamento. O frontman Luís Judícibus deixou a guitarra em palco e invadiu o espaço da audiência para cantar bem ali à nossa frente e para o número “Jump the fuck up” versão 2025!
Tal como as super dançáveis “Pretty Sticks” e “Everybody, Everything”, a versão aditivada de “Les Gens Sont Fous, Les Temps Sont Flous” representa a libertação ao terceiro álbum das teias formais que, de alguma forma prendiam a banda a um Pop Rock Psicadélico demasiado certinho. Atenção, Golden Cap (2017) e Under the Weather (2020) comportam boas ideias e boas malhas, e mais do que merecem a audição atenta. No entanto, Best Behavior transporta uma licença, ou melhor, uma ordem para a jarda!
Os dez temas do disco mostram-nos uma versão mais pesada e mais direta da música do quinteto formado por Diogo Sá (guitarra), Francisco Dias Pereira (maquinaria), Hugo Luzio (bateria), João Tomázio (baixo) e pelo já citado Luís (voz e guitarra), o que, porém, não significa necessariamente que estejamos perante um álbum simples ou até fácil de entrar. É nesse sentido que a cover de Jacques Dutronc pode enganar. A minha experiência é que, fora dos palcos, Best Behavior obriga, mais do que convida, a ser ouvido repetidamente. E a minha experiência é que, a partir da terceira audição, se começa a perceber que sair da gaveta do psicadelismo do início do séc XXI para entrar na desarrumada estante do post punk atual não implicou que a banda deixasse cair a musicalidade e os jogos intrincados entre instrumentos ou o encadeamento de movimentos para além da dinâmica loud/quiet/loud.
A partir da terceira audição, os 35 minutos de Best Behavior começam a passar a correr … e toda a atenção parece ser pouca para conseguirmos apanhar todas as pequenas pérolas que os cinco foram espalhando pelas suas composições. Eu tenho um fraco por pontes, pré e pós refrões orelhudos – cresci nos anos 80, que querem que faça? – e este disco tem um bom punhado deles, muitas vezes enriquecidos com coros cheios e vibrantes como em “Pretty Sticks”, em “Not me” ou em “Wilds”.
Para além de um excelente frontman, Luís Judícibus mostra um variadíssimo leque de registos vocais, o que corre o risco de passar despercebido dada a utilização destas ferramentas em serviço das diferentes partes das canções … é forte, tem caráter e por isso não se impõe nem pisa ninguém! A secção rítmica, mais do que segura, é aventureira e acompanha tanto as cavalgadas como cria contrastes cheios de texturas nos momentos mais calmos como me “Not me” ou “Next Emma Stone”.
Voltando um pouco atrás, um dos aspectos que me atrai mais no tal post punk atual é a liberdade que as bandas vão mostrando nas suas misturas sónicas e como a partir das suas referências, vão construindo as suas identidades, apesar da (apenas) aparente reciclagem de testemunhos do passado. No caso dos Them Flying Monkeys, a âncora que estará algures entre o poder dos Idles e a insustentável leveza do ser dos Fontaines D.C., é suficientemente forte para aguentar os desvios constantes para sons mais pesados – como avisam logo na explosão de “Beautiful Mess”. Sente-se que em Best Behavior, a banda tanto vai beber ao som Industrial dos Nine Inch Nails, sobretudo em riffs sintetizados (“Pretty Sticks”, “Wilds”) como aos belos diálogos delirantes entre guitarras e sintetizadores dos Deftones (“Aims”, “Fake it”). Tudo sem perder um pingo de identidade, sem soar a pastiche.
Em resumo, é um disco que transposto para os palcos nos faz mexer e vibrar, mas que em casa, pede atenção e dedicação … e que muito faz por a merecer!