Três meses após o lançamento do primeiro single, os Capitão Fausto puseram fim à espera e lançaram o seu quinto álbum. Composto por dez faixas, Subida Infinita é, simultaneamente, um regresso a casa e uma busca por novos itinerários.
Desde dezembro que nos têm chegado cheirinhos do Subida Infinita, com o lançamento gradual de cinco singles, e desde então que temos vindo a poder perceber a temática central do disco: a mudança, o crescimento, o passado que nos permite chegar ao futuro. Francisco Ferreira, excepcional teclista da banda, seguirá, doravante, novos caminhos e os Capitão Fausto passarão a ser quatro, pelo que este disco tem, além de tudo, um gosto a despedida de algo maior.
Os três primeiros álbuns dos Capitão Fausto concederam-lhes um lugar privilegiado na cena musical portuguesa e deram-lhes um carinho muito particular por parte do seu público, cada vez maior e mais fiel, que se revia na sua pose jovem despreocupada e que foi crescendo ao seu lado. Em 2019, apareceram mais maduros em A Invenção do Dia Claro, com melodias assumidamente pop e inícios de crises da idade adulta. Uma pandemia depois, a banda conseguiu sempre encontrar formas de se reinventar, de fazer diferente, de responder aos anseios novos com que se deparava à medida que a vida corria (nota de destaque para o Sol Posto!) e o público, seu atento companheiro, cresceu com ela. Agora, cinco anos volvidos, os Capitão Fausto voltaram, fortes como sempre, num disco que parece ser o culminar da estética que eles próprios têm vindo a construir para si.
“Nunca Nada Muda” foi o primeiro single a ser lançado e faz sentido que assim tenha sido. A expectativa sobre a sonoridade do disco era alta e a faixa é representativa tanto do ideário do álbum como da exploração instrumental por que entrou a banda. A juventude tem muitas possibilidades. Teria infinitas se os miúdos tivessem a capacidade de as idealizar, mas também não têm ainda horizonte que lhes permita vislumbrar a infinitude do mundo – só conseguem ver à sua frente a incomensurabilidade do tempo e pensam-se imortais. Ainda assim, dão-se a tudo, porque passam os dias a ouvir dos mais velhos que até a plasticidade do seu corpo tem prazo de validade e que, quando derem por isso, já não irão a tempo de se agarrar a nada. Curiosos, entregam-se à maravilhosa descoberta da vida e para ela têm sonhos e desenham projetos. Vivem os minutos simultaneamente como se fossem os últimos e como se fossem intermináveis. Vão aprendendo com as suas escolhas e com o que delas resulta. Um dia, já não está nada como era. Há uma vida pela frente, mas “a pica” parece desvanecer. Então escreve-se esta letra e compõe-se esta música.
Daí para a frente, estava lançado o mote. As rimas cruzadas e o rock de “Muitas Mais Virão” põem, à partida, o dedo na ferida, ao falarem da tristeza coletiva não assumida, de quando percebemos que estamos todos a sofrer individualmente sem falarmos sobre isso. Em contrapartida, “Nada de Mal” serve de nota de apreciação da amizade e do seu poder de enquadrar a nossa vida num contexto que faz sentido, no meio da vastidão imprevisível e inimaginável que é o resto do mundo.
É vã a tentativa de classificar o estilo dos Capitão Fausto e, sobretudo, deste álbum, coerentemente diverso nos instrumentais e criativo nas melodias. “Na Na Nada” pede os efeitos sonoros emprestados aos anos 80 e “Há Sempre um Fardo” ostenta no baixo, na guitarra, nos coros, nos sopros. A percussão de “Andar à Solta” torna-a uma das músicas mais orelhudas do disco, e remete-nos, de certa forma, para o álbum que a Cuca Monga lançou em pleno 2020, Cuca Vida. A letra, menos otimista, sublinha a crise dos 35, que pauta todo o LP, em que começa a ser difícil afirmar a juventude quando a idade vai deixando cada vez mais marcas e se luta interiormente pelos últimos resquícios da opinião de que se é invencível.
Uma das estrelas discretas do disco é “Cantiga Infinita”, produto da potente aliança entre Capitão Fausto e Tim Bernardes, cuja amizade ouviu as preces de quem pedia um trabalho conjunto e criou uma música bonita, com uma melodia muito própria da banda com a voz inconfundível do cantautor paulistano. Em “Nuvem Negra”, a última faixa antes do epílogo “Subida Infinita”, ouve-se o bater de um coração na percussão e fala-se sobre a perda e sobre a convivência com a ausência. É uma forma intensa, e bela, de chegar ao final.
A capa de Subida Infinita é uma fotografia tirada algures na Serra da Estrela, no meio do verde imenso. É, quiçá, a vista que se tem quando se faz tanta introspeção como aquela que permitiu aos cinco amigos chegar aqui, sãos e salvos. A vida troca as voltas a toda a gente e manter a cabeça à tona não é tarefa fácil, mas é possível se tivermos ao nosso redor a dose certa de amor, curiosidade e criatividade. Os Capitão Fausto são uma parte muito importante da música portuguesa contemporânea e cresceram ao lado de mais do que uma geração; as coisas mudam, mas a saudade abre novas possibilidades. Subida Inifnita, último disco dos Capitão Fausto como os conhecemos, honra Alvalade e faz crescer a expectativa sobre o futuro destes veteranos do rock.
Os Capitão Fausto estão em digressão até ao fim do ano, com mais de 20 concertos de norte a sul do país.