Madonna é uma figura essencial, não só na música, mas também no papel de defensora acérrima da igualdade de géneros, do feminismo e da liberdade sexual e religiosa.
A reação imediata às primeiras imagens de Becoming Madonna é :”hmm… mais um documentário sobre como a Madonna começou…”. Aliás, o título aponta para esse caminho. Mas afinal era só um teaser. Este filme não é assim tão simplista e um dos seus grandes erros é mesmo o nome. Talvez fizesse mais sentido chamar-se “Being Madonna”, porque é disso que trata: da essência de Madonna e não tanto o seu percurso até se tornar na denominada rainha da pop.
A história centra-se entre 1978 e 1992 mas, desta vez, o realizador, Michael Ogden, recua até a uma Madonna criança e adolescente na sua terra natal – Bay City, no estado do Michigan, e às aulas de ballet que a levaram para Nova Iorque, para onde se mudou aos 17 anos, fugindo de uma família tradicional e religiosa na qual o papel da mulher – mesmo em criança – era fazer as tarefas da casa e ser bem comportada, enquanto os rapazes “podiam fazer tudo”.
Além disso, cruza todo esse percurso inicial com o que se passava em Nova Iorque no final dos anos 1970 e início de 1980 com a explosão do punk e dos pequenos clubes como o CBGB, mas também com a crescente criminalidade de uma cidade suja, dura e caótica e até com a chegada à presidência do ultra conservador e defensor dos bons costumes Ronald Reagan.
Aliás, essa ligação entre o percurso inicial de Madonna e a história dos EUA está patente em todo o filme que usa apenas videos e imagens de arquivo, excertos de entrevistas que Madonna deu noutras ocasiões e entrevistas em voz off a pessoas ligadas a ela de várias formas, incluindo o irmão.
Acontece também quando Michal Ogden mostra como Madonna se tornou uma voz activa na defesa dos direitos LGBT, principalmente quando apareceu o vírus da SIDA e os homossexuais eram profundamente denegridos e mal tratados por uma sociedade de falsos moralistas, como diz a própria num dos excertos.
Este é, aliás, o foco deste documentário, mostrar como Madonna se tornou numa defensora acérrima da igualdade de géneros, do feminismo e da liberdade sexual e religiosa e abriu espaço para que outras artistas – como Britney Spears ou Charli XCX – pudessem também ser livres e explorar a sua sexualidade livremente. Aliás, o documentário termina com uma nota muito relacionada com isso: “Madonna é a artista a solo feminina com o maior sucesso de sempre nos top de música”.
Michael Ogden peca, contudo, por algumas inconsistências. O início difícil em Nova Iorque parece cortado quando se dá um salto para o casamento com Sean Penn que parece não ter ali lugar quando o objetivo é falar do Madonna advoga. Volta a entrar no eixo central com a questão da SIDA e dos direitos LGBT, mas na questão da liberdade sexual e religiosa foca-se – talvez demasiado – nas mais do que conhecidas polémicas que acompanharam este período de meados dos anos 80 até 1992: a tourné onde simula uma masturbação e orgasmo em Like a Virgin; o video de Like a Prayer em que beija um Jesus negro, o livro Sex e o álbum Erotica, mencionado de passagem.
Estas inconsistências são, contudo, atenuadas pelo cunho pessoal e emocional dos excertos de entrevistas que foram escolhidos, tanto os de Madonna como das pessoas que a rodearam. Afinal, ainda há coisas para descobrir sobre o percurso da rainha da pop.