O álbum homónimo de Clap Your Hands Say Yeah é o retrato de uma adolescência tardia — não a dos anos, mas a da música independente, que ainda acreditava que bastava um grupo de amigos, uns amplificadores e um site manhoso para mudar alguma coisa.
Escrevi uma crónica sobre este disco em 2009, na altura ainda éramos um blog, e foi inserido num exercício de nomear discos da década dos 00s. Fui ler, e não só não faz jus ao disco que é este Clap Your Hands Say Yeah, como sinto que envelheceu mal. Ao contrário do disco em si, que, na minha humilde opinião, continua fresco e fofo, cheio de energia, dançável, estimulante. Ou então, poderá ser só o equivalente a olhar para uma polaroid de 2005: granulada, desfocada, mas cheia de vida.
Por um breve momento, ali entre 2004 e 2007, parecia que o mundo da música estava a ser reinventado num quarto. Antes dos algoritmos, antes das playlists, quando o word of mouth ainda era literal — um amigo que te passava um CD gravado com uma banda nova, um link num fórum, uma recomendação num qualquer blog. Foi nesse espaço de improviso e convicção que surgiu o primeiro álbum dos Clap Your Hands Say Yeah, e me conquistou com a sua vivacidade contagiosa.
Nessa altura, o termo indie ainda significava “independente” no sentido mais cru. Sem editora, sem assessores, sem grandes expectativas, apenas um tipo de Filadélfia, que juntou à volta da música criada por sí alguns músicos e acreditou que podia gravar um disco em casa e deixá-lo cair na Internet, como quem lança uma garrafa ao mar. E o mais improvável aconteceu: a garrafa foi apanhada. O buzz cresceu, a Pitchfork escreveu, as vendas dispararam — e de repente, um disco de produção caseira tornou-se um fenómeno.
Mas o sucesso nunca foi o ponto. Clap Your Hands Say Yeah é um álbum desajeitado, torto, eufórico. As guitarras soam como brinquedos eléctricos a colapsar, o baixo insiste em melodias quase infantis, a bateria parece estar sempre a correr atrás de si própria. No centro de tudo, a voz do mentor disto tudo, Alec Ounsworth — esganiçada, desafinada, mas viva, intensamente viva.
Há discos que soam ao que éramos; este soa ao que queríamos ser, numa mistura de entusiasmo ingénuo e desespero criativo. “Let the Cool Goddess Rust Away” abre como uma chamada à desordem — uma marcha para o desconhecido. “Over and Over Again (Lost and Found)” é uma gargalhada nervosa transformada em canção. “The Skin of My Yellow Country Teeth”, esse hino inesperado, é pura libertação: uma estrada aberta para quem precisa de fugir, nem que seja para dentro de si. “Is This Love”, a música que ainda me aparece no top 10 das minhas mais ouvidas de sempre, se for ao iTunes, plataforma por mim utilizada na altura. E ainda temos mais duas canções incríveis, intensas e frenéticas – “In This Home on Ice” e “Upon This Tidal Wave of Young Blood”.
Ouvir o álbum hoje é revisitar o instante em que a música independente ainda acreditava que podia mudar alguma coisa. Antes de o indie se tornar num género de catálogo no Spotify, antes de as capas deixarem de parecer fotocópias e os refrões deixarem de soar a improviso. Havia ali uma inocência e uma vontade de descoberta contínua que nos estimulava a ouvir nova música a cada dia que passava, e, por um minuto ali, os Clap Your Hands foram uma banda maior que a vida. Depois ainda editaram um Some Loud Thunder, engraçado qb, mas facilmente esquecível.
Clap Your Hands Say Yeah não é um disco perfeito; é um disco que falha, tropeça, ri-se da queda e volta a tentar, mas talvez por isso ainda resista. Porque há dias em que a vida parece um concerto desalinhado, e tudo o que podemos fazer é continuar a bater palmas — mesmo que ninguém saiba bem o ritmo, ou tenha uma voz afinada para cantar.