Há aqueles concertos de estádio cheio, com 50 ou 80 mil espectadores ao rubro, que chegam horas antes ou mesmo uns dias antes, em todo um ritual de chegada e há aqueles concertos de sala, intimistas, para 50 ou 80 pessoas, que chegam em cima da hora, em todo um ritual de chegada. O concerto de ontem dos portugueses They’re Heading West e dos seus convidados e amigos You Can’t Win Charlie Brown foi um exemplo destes últimos, intimista e aconchegante para a alma.
Há que começar talvez por fazer um pequeno enquadramento. Os They’re Heading West são um projecto de Francisca Cortesão e Mariana Ricardo (dos Minta & The Brook Trout), João Correia (dos Julie & The Carjackers e Tape Junk) e Sérgio Nascimento (baterista de Sérgio Godinho e David Fonseca, entre outros). Formaram-se com o objectivo de angariarem dinheiro para ir até à Costa Oeste dos Estados Unidos (como Portland, São Francisco, etc.) e dar concertos. Inicialmente tocavam apenas temas dos vários projectos de cada um mas depois desta viagem, o conceito They’re Heading West começou a ganhar vida própria. Daí resultou o EP THW#2 que está disponível para download no bandcamp da banda.
Posto isto, em Fevereiro de 2011 iniciaram estas noites de concertos/convívio n’A Barraca e que continuam agora na Casa Independente, em pleno renovado, refrescante e seguríssimo Largo do Intendente. Acontecem sempre às 5ª feiras, sempre no formato They’re Heading West mais convidados, sendo a próxima sessão no dia 24 de outubro com os TV Rural.
Quanto ao concerto, foi o que dissemos anteriormente. Foi intimista e aconchegante para a alma. Para já o local assim o proporciona: estamos num primeiro andar de uma casa normal, com várias salas, casa de banho e cozinha (apenas acessível pelos empregados do bar (naturalmente)). As salas têm uma decoração muito simpática, num estilo new-vintage e a luz cria o tal aspecto intimista, cozy, sereno. Neste ambiente, e na sala maior da casa, com um palco possível mas com as condições mínimas para poder dar um espectáculo com qualidade, os They’re Heading West apresentaram-se e tocaram cerca de 45 minutos.
Ouvir os They’re Heading West pode nos levar a fazer um exercício de imaginação. Vamos imaginar que são estrangeiros. Vamos imaginar igualmente que têm os melhores instrumentos, colunas, amplificadores, etc. Vamos também por fim imaginar que têm um apoio de massa (tanto de pessoas como de “massa” mesmo – dinheiro). Será que não encheriam estádios? Talvez não. Aos estádios só chegam alguns artistas ainda assim. Mas encheriam Coliseus, Campos Pequenos, Casas de Música? Certamente. O talento existe e sobeja, a qualidade está lá de sobra também, o carinho com que tratam cada música envolve cada um de nós que temos a oportunidade de estar presentes. É mesmo reconfortante.
Como habitualmente, a passagem de palco juntou os dois grupos que tocaram juntos. Os You Can’t Win Charlie Brown, apenas representados por 4 dos seus 6 elementos, encheram o palco com os 4 They’re Heading West. Ainda assim, o palco esteve no fim ainda mais cheio com mais a participação de Walter Benjamim, para todos juntos tocarem a poderosa “Over The Sun/Under The Water”.
Sobre os You Can’t Win Charlie Brown podemos dizer tudo o que dissemos de They’re Heading West e ainda um pouco mais. Não desfazendo THW (ou qualquer outro projecto ou banda portuguesa), os YCWCB são especiais. São do mais talentoso que o nosso país já viu nascer. Não é por acaso que a conceituada revista francesa Les Inrockuptibles os comparou aos Grizzly Bear, chegando inclusivamente a preferi-los ao conjunto nova iorquino. Tocaram também cerca de 45 minutos e puderam apresentar algumas das novas músicas que vão fazer parte do sucessor de Chromatic, de 2011. E amigos, se soam assim, com formação incompleta, imaginem como soarão completos e em disco! Extraordinário! O segundo álbum promete muito por esta pequena demonstração. Ficámos ansiosos.
*com a colaboração de Duarte Pinto Coelho