Passados seis anos, o regresso dos Fleet Foxes é tão difícil quanto a sua separação. Crack-Up tem um desrespeito total pela estruturação verso/refrão – e isso não é um insulto.
Em Outubro de 2013, Robin Pecknold era um homem perdido. A visão de outrora, que o ajudara a compor Helplesness Blues (2012), o aclamado segundo disco de Fleet Foxes, já não fazia sentido. Em contraste com o sucesso do segundo disco, que chegou a ser nomeado para um Grammy, o companheirismo foi trocado pelo ódio. Em Janeiro de 2013, os Fleet Foxes cessam a sua actividade por tempo indefinido, sem destino.
A banda separou-se e Pecknold precisava de reflectir. Sentia que o seu estilo autoritário em estúdio, forçando as suas composições aos restantes membros, em nome da sua visão, estragara a banda. O baterista Josh Tillman, motivado pelo mal-estar na banda e pelo desejo de ser Father John Misty, abandonou as raposas. Pecknold precisava de uma revolução: cortou o cabelo e a barba e, em jeito de penitência, afastou-se de guitarras. Foi tirar um curso pós-laboral para a Universidade de Columbia.
Seis anos depois, a fobia pelas guitarras passou e escreveu ideias num documento do google drive, que enviou para os restantes membros dos Fleet Foxes, incentivando-os a participarem no processo criativo. Desta vez, o frontman estava decidido a deixar de ser frontman, e quis criar um álbum de todos.
Assim nasceu Crack-Up, o terceiro disco. À primeira audição, não temos dúvidas: estamos perante um disco de Fleet Foxes. Tem harmonias barrocas a quatro vozes, guitarras folk dedilhadas e letras que pintam um quadro impressionista. Contudo, tem todas as características necessárias para ser a continuidade natural – ou o irmão estranho? – de Helplessness Blues: progressões épicas de orquestração e um desrespeito total pela estruturação verso/refrão.
Os Fleet Foxes anunciam a desconstrução da sua própria estética na canção que abre o disco, “I Am All That I Need / Arroyo Seco / Thumbprint Scar”. Três partes distintas numa só canção, que não se inibe em mostrar a novidade: Pecknold é capaz de cantar em tons graves e os Fleet Foxes gostam de fazer canções épicas que não são orelhudas.
A tónica de Crack-Up está nos fragmentos mais atonais do segundo disco, que são o reflexo da confusão de Pecknold durante os seis anos de hiato. Há menos refrões e mais modulações, e múltiplas referências à cultura erudita. Em “Third of May / Odaigahara”, há referências à obra de Goya; Em “On The Other Ocean” e “Fool’s Errand” existe um sample de uma canção de Mulatu Astatke, artista etíope de jazz.
Do ponto de vista conceptual, Crack-Up faz sentido. Pecknold apropriou-se do nome de uma obra de F. Scott Fitzgerald, publicada em 1936, onde o autor retrata uma crise existencial. Ao The New York Times, Pecknold revela que este disco é, à semelhança da obra de Fitzgerald, sobre a “necessidade de construir as razões para viver”.
Crack-Up são as pegadas que Pecknold foi deixando ao longo destes seis anos conturbados de hiato. O frontman das raposas deixou um rasto pouco orelhudo, que não procura conquistar novo público, mas sim reinstalar o bem-estar entre uma banda que já encontrou o seu lugar no panorama musical.